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Capítulo IV – Da Coisa Julgada

Art. 103 a 104
Comentado por Samirys Verzemiassi
27 mar 2024
Atualizado em 28 maio 2024

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I – erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;
II – ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;
III – erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

O artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor é fundamental para estabelecer como as decisões tomadas em ações coletivas afetam os direitos dos consumidores, tanto individual quanto coletivamente.

Os impactos das decisões judiciais em contextos onde múltiplos consumidores são representados são delineados neste artigo, orientando sobre a aplicação dos efeitos da coisa julgada nas diversas situações possíveis.

O primeiro inciso do artigo estipula que as sentenças em ações coletivas que abordam interesses dos consumidores como um todo têm efeito erga omnes, ou seja, para todos. Isso significa que os resultados dessas ações se aplicam a todos os consumidores afetados, a menos que a ação seja julgada improcedente por insuficiência de provas. Neste caso, permite-se que novas ações sejam propostas com novas provas, evitando que a falta de provas inicialmente adequadas preclua reivindicações legítimas. 

O segundo inciso trata de ações coletivas que representam um grupo específico, aplicando um princípio similar: se improcedente por falta de provas, novas ações podem ser ajuizadas, protegendo assim os direitos do grupo específico representado.

O terceiro inciso detalha o tratamento de ações coletivas que buscam tutelar direitos individuais homogêneos, onde a coisa julgada só terá efeito erga omnes se o pedido for procedente, beneficiando todas as vítimas e seus sucessores. Caso contrário, permite-se que aqueles que não foram parte da ação possam individualmente propor ações de indenização.

Os parágrafos adicionais clarificam que os efeitos da coisa julgada em ações coletivas não prejudicarão os direitos individuais dos integrantes do grupo, categoria ou classe, garantindo que ações individuais possam ser propostas independentemente dos resultados das ações coletivas. 

O segundo parágrafo ressalta que, mesmo em casos de improcedência por direitos individuais homogêneos em ações coletivas, os indivíduos afetados que não se envolveram como litisconsortes ainda têm o direito de buscar reparação individual. 

Além disso, o terceiro parágrafo afirma que as vítimas de uma ação coletiva procedente podem proceder à liquidação e execução da sentença, conforme previsto em outras seções do CDC. 

O último parágrafo estende as regras de coisa julgada da ação coletiva para a sentença penal condenatória, destacando a integração entre responsabilidade civil e criminal no contexto dos direitos do consumidor.

Assim, o artigo 103 do CDC mostra a preocupação do legislador em fornecer um mecanismo legal que assegura a adequada proteção dos direitos dos consumidores em ações coletivas, ao mesmo tempo que permite flexibilidade para novas ações baseadas em novas evidências, garantindo que as decisões judiciais sejam justas e reflitam a realidade dos fatos.

Jurisprudência: “EMENTA:  PROCESSUAL  CIVIL  E  CONSUMIDOR.  VIOLAÇÃO  DO ART. 535 DO CPC/1973 DEFICIÊNCIA  NA  FUNDAMENTAÇÃO.  SÚMULA 284/STF. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO  DE  SAÚDE.  COBERTURA  DO PROCEDIMENTO DE DRENAGEM LINFÁTICA. ALEGAÇÃO   DE   CUMPRIMENTO   DE   RESOLUÇÃO   DA   ANS.   FALTA  DE PREQUESTIONAMENTO.  ATO  QUE  NÃO  SE  ENQUADRA  NO  CONCEITO DE LEI FEDERAL.  CONHECIMENTO  EM  RECURSO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. COISA JULGADA   EM   DEMANDA   COLETIVA.   EFEITOS.  DANO  MORAL  COLETIVO RECONHECIDO  PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. PEDIDO PARA QUE O STJ EXCLUA A CONDENAÇÃO  OU,  SUCESSIVAMENTE,  REDUZA  O  VALOR. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1.  Não  se  conhece do Recurso Especial em relação à ofensa ao art. 535  do  CPC/1973 quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF. 2.  A  parte  recorrente  sustenta  que apenas no ano de 2004, com a edição da Resolução ANS, o procedimento de drenagem linfática passou a  ser de cobertura obrigatória pelas seguradoras de plano de saúde. Nesse  ponto,  não  se  pode  conhecer  do  recurso. A uma, porque o acórdão  recorrido  não  decidiu a demanda referindo-se à mencionada Resolução,  faltando  o  requisito do prequestionamento. A duas, por demandar  interpretação  de  normativo  interno de órgão federal não enquadrado  no  conceito  de lei federal. Ressalte-se que, de acordo com  o  art.  105,  III, alínea “a”, da Constituição Federal, não se pode  analisar eventual ofensa a resoluções, regulamentos, portarias ou  instruções  normativas,  por  não  estarem  tais atos normativos compreendidos na expressão “lei federal”. Precedentes do STJ. 3.  In  casu,  recorrer  aos “limites da competência” para reduzir a efetividade  da  decisão  em  Ação  Coletiva implica infringência às regras do CDC, as quais determinam que o juízo do foro da Capital do Estado ou do Distrito Federal detém competência absoluta para julgar as  causas  que  tratem  de  dano  de  âmbito  nacional ou regional, aplicando-se,  ademais,  as  regras  do CPC aos casos de competência concorrente.  Nesse  contexto, deve-se elidir eventual interpretação literal  do artigo 2º-A da Lei 9.494/1997, que lhe confira o sentido de  limitar a eficácia da coisa julgada, porquanto tal interpretação ofenderia  a  integração normativa entre as disposições do Código de Defesa  do Consumidor e da Lei da Ação Civil Pública. Precedentes do STJ. 4. A propósito, a Corte Especial decidiu, em recurso repetitivo, que “os  efeitos  e  a  eficácia  da  sentença não estão circunscritos a lindes  geográficos,  mas  aos limites objetivos e subjetivos do que foi  decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano  e  a  qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts.  468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC)” (REsp 1243887/PR, Rel. Ministro   Luis  Felipe  Salomão,  Corte  Especial,  julgado  sob  a sistemática prevista no art. 543-C do CPC, DJ 12/12/2011). 5.  No  que  se  refere  à  condenação da seguradora em danos morais coletivos,  o  acórdão objurgado estabeleceu que a recusa ao custeio do  procedimento causou insegurança, frustração e aflição a todos os segurados  que  tiveram  o  direito  ao  tratamento desrespeitado. A compreensão  do Sodalício a quo está em consonância com a orientação do  Superior  Tribunal  de Justiça de que é cabível a condenação por danos  morais  em  Ação Civil Pública (AgRg no REsp 1541563/RJ, Rel. Ministro  Humberto  Martins, Segunda Turma, julgado em 8/9/2015, DJe 16/09/2015). Fixado o cabimento do dano moral coletivo, a revisão da prova  da sua efetivação no caso concreto e da quantificação esbarra na Súmula 7/STJ. 6. Agravo Interno não provido.” (STJ; Agravo Interno no Recurso Especial AgInt no REsp 1528392 / SP; Relator(a): Herman Benjamin; Órgão Julgador: 2ª Turma; Data da Decisão: 20/04/2017; Data de Publicação: 05/05/2017)

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

O artigo 104 do Código de Defesa do Consumidor desempenha um papel importante na interação entre ações coletivas e ações individuais, abordando uma questão crucial nos direitos processuais dos consumidores. Esse dispositivo legal estabelece normas importantes que garantem a coexistência dessas duas modalidades processuais, assegurando que uma não prejudique a outra, enquanto delineia como os efeitos da coisa julgada das ações coletivas impactam as ações individuais.

No que se refere à litispendência e ações individuais, o artigo clarifica que as ações coletivas previstas nos incisos I e II do parágrafo único do artigo 81 não induzem litispendência para as ações individuais. Isso implica que a existência de uma ação coletiva tratando de certos direitos dos consumidores não impede que um consumidor individualmente proponha ou continue uma ação individual sobre o mesmo tema.

Essa disposição é fundamental para assegurar que os consumidores não sejam obrigados a depender exclusivamente das ações coletivas, que podem ter objetivos mais abrangentes e menos específicos do que as necessidades individuais de cada consumidor.

Além disso, o artigo esclarece os efeitos da coisa julgada decorrentes das ações coletivas, seja erga omnes (para todos) ou ultra partes (limitada ao grupo, categoria ou classe). Esses efeitos não beneficiarão os autores de ações individuais, a menos que haja um pedido formal para suspender a ação individual dentro de 30 dias após serem notificados do ajuizamento da ação coletiva.

O requerimento de suspensão da ação individual é uma estratégia processual que permite ao autor individual aguardar o resultado da ação coletiva, que pode resolver ou influenciar significativamente os aspectos de sua demanda individual. Isso ajuda a evitar decisões judiciais contraditórias e a otimizar os recursos do judiciário, alinhando os resultados das ações coletivas com as individuais quando os contextos são compartilhados.

O artigo 104 do CDC é um exemplo claro de como o direito brasileiro busca equilibrar a proteção eficaz dos direitos dos consumidores com a eficiência processual. Ao permitir que as ações individuais prossigam paralelamente às ações coletivas, mas também ao estabelecer mecanismos para alinhar os efeitos de suas sentenças quando apropriado, o CDC assegura que os consumidores possam escolher a via de ação mais adequada às suas necessidades específicas sem perder os potenciais benefícios de uma ação coletiva. 

Assim, esse dispositivo reforça a autonomia do consumidor e a eficácia do sistema judiciário na proteção dos direitos consumeristas.

Jurisprudência: “EMENTA:  ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA. ART. 104 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. 1. Consoante o entendimento desta Corte, a incidência do art. 104 do CDC se dá em casos de propositura da ação coletiva após o ajuizamento de ações individuais, hipótese diversa da situação dos autos, em que a ação coletiva foi proposta antes da ação individual. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ; Agravo Interno no Recurso Especial AgInt no REsp 1545185 / SC; Relator(a): Og Fernandes; Órgão Julgador: 2ª Turma; Data da Decisão: 05/03/2020; Data de Publicação: 19/03/2020)

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Advogada (OAB 320588/SP), fundadora do escritório Verzemiassi e Carvalho Advogados, com atuação em São Paulo e Jundiaí. Bacharela em Direito pela Universidade São Judas Tadeu, São Paulo/SP. Especialista em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Damásio de Jesus....

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