Periculum in mora é um conceito difundido no direito, especialmente no direito processual, para identificar situações de urgência em que a demora na prestação jurisdicional possa afetar de forma irreparável o direito a ser tutelado, possibilitando a aplicação de tutelas provisórias.
Diversas situações enfrentadas por pessoas e por organizações demandam soluções urgentes. Não raras vezes a ameaça ou a violação a um determinado direito pode gerar danos irreparáveis, com os quais a tutela jurisdicional do Estado restaria esvaziada.
Por exemplo: a negativa de um plano de saúde com relação a uma cirurgia de emergência pode representar a causa da morte de uma pessoa.
Para situações como essa, o sistema jurídico não pode apresentar tão somente o curso regular do processamento de um feito, com a demora que é conhecida por todos. Há, portanto, uma alternativa, consistente na possibilidade de que o Juízo, preenchidos requisitos legais, profira uma decisão liminar, de natureza provisória, com o objetivo de preservar imediatamente o direito alegado ao menos durante o processo.
A apreciação e o deferimento das tutelas de urgência não depende apenas do arbítrio do Juízo, mas da observância dos requisitos legais. Um destes requisitos é o periculum in mora, que se ocupa com a irreparabilidade de uma eventual demora na proteção do direito alegado.
Um dos requisitos para que uma decisão liminar seja concedida é que o trâmite processual regular represente um risco de que o objeto do processo acabe se perdendo ou seja gravemente prejudicado em razão do decurso do tempo.
Neste artigo abordaremos o significado e a importância do periculum in mora, bem como a forma de fundamentação do requisito para a finalidade de antecipação dos efeitos da tutela.
Além disso, distinguiremos o periculum in mora do outro requisito para a concessão da tutela antecipada, o fumus boni iuris. Ao final da leitura, esperamos que você tenha uma visão completa sobre o instituto e o seu papel fundamental na proteção dos direitos ameaçados!
O que é periculum in mora?
Periculum in mora é o termo em latim para “perigo na demora”, portanto trata-se das situações em que a ameaça iminente de dano irreparável a um direito justifique a necessidade de uma solução urgente e imediata.
Portanto, há que se destacar os elementos essenciais do periculum in mora, que são cumulativos:
- Ameaça iminente;
- Dano irreparável.
Não há dúvida, assim, que o periculum in mora é um dos requisitos para garantir a proteção de direitos ameaçados por danos potencialmente irreparáveis. Contudo, vale recordar que o perigo na demora não é o único requisito a ser observado para a demonstração da necessidade de um provimento jurisdicional urgente e imediato.
O sistema jurídico, ciente da importância das medidas liminares, incluindo a tutela antecipada, dispôs expressamente a respeito da necessidade de caracterização do periculum in mora no deferimento da tutela provisória, como prevê o art. 300 do CPC:
Observa-se, segundo a redação legal, que o requerente deve demonstrar não apenas o perigo na demora, consubstanciado na hipótese de dano irreparável ao direito invocado, como também a probabilidade do direito. A probabilidade do direito é representada pela expressão latina fumus boni iuris, e trataremos dela adiante.
O que caracteriza periculum in mora?
A caracterização do periculum in mora decorre de seu próprio conceito: deve-se demonstrar que uma ação ou omissão ameaça a imposição de um dano irreparável a um determinado direito.
Diversos são os campos de aplicação do periculum in mora, sendo necessário, em todos, a demonstração de uma ameaça iminente de danos irreparáveis que fundamentam a necessidade de uma medida imediata.
Para a fundamentação do periculum in mora, que será abordada no próximo tópico, é essencial que haja prova ou um início de prova (nas situações em que a produção da prova é complexa um dificultosa) capaz de demonstrar ao Juízo que a ameaça é iminente e real.
A fim de demonstrar, na prática, o que caracteriza o periculum in mora, foram selecionadas situações de diversas áreas do direito em que o instituto pode ser observado. Confira as situações simplificadas e resumidas:
Periculum in mora no Direito Imobiliário:
Situação: Em uma locação, se o inquilino não cumprir com as suas obrigações de, por exemplo, promover ou permitir a realização de reparos essenciais ao imóvel, pode o locatário requerer o deferimento de uma tutela de urgência para que os reparos sejam feitos imediatamente.
Caracterização: A demora no cumprimento da obrigação pode causar danos à saúde ou à segurança dos moradores. Recomenda-se, para instruir o pedido, a prova da relação jurídica, a necessidade de reparo e a demonstração de resistência ou inércia do inquilino em realizá-lo ou permiti-lo ser executado pelo proprietário.
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Periculum in mora no Direito do Trabalho:
Situação: Hipótese em que um empregado é dispensado sem justa causa mas o empregador deixa de realizar o pagamento de seus salários pendentes.
Caracterização: Tendo em conta a natureza alimentar do salário, pode o empregado requerer o deferimento de uma medida liminar que obrigue o empregador a realizar o pagamento dos salários pendentes, já que a demora envolvida no processo judicial pode prejudicar sobremaneira a situação financeira do empregado e de sua família.
Deve-se, portanto, demonstrar o encerramento da relação contratual e, caso os pagamentos sejam realizados por transferência bancária, a falta dos alegados salários pendentes.
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Periculum in mora no Direito da Saúde:
Situação: Negativa de plano de saúde ao tratamento de doença grave ou à realização de procedimento de urgência.
São exemplos recorrentes determinados tratamentos contra o câncer, como a imunoterapia, e a realização de procedimentos cirúrgicos que dependam de determinados materiais ou que sejam feitos por meio de determinadas técnicas.
Caracterização: A negativa em desfavor de beneficiário de plano de saúde, quando há risco de morte ou de dano irreparável, caracteriza um perigo iminente que deve ser combatido pelo sistema jurídico. Assim, deve o Juízo verificar a gravidade do possível impacto para que uma medida efetiva seja adotada com urgência.
Periculum in mora no Direito Ambiental:
Situação: Empresa poluidora que desrespeita normas ambientais e não apresenta controle sobre suas atividades. Havendo fiscalização pela autoridade competente, a empresa ainda assim deixa de adotar medidas corretivas imediatas.
Caracterização: O dano ambiental no mais das vezes é difuso, irreparável ou de difícil reparação e afeta a qualidade de vida e a sobrevivência de diversas espécies, inclusive a humana. Não há dúvida, portanto, que a demora na paralisação do dano pode prejudicar o meio ambiente de forma irrecuperável.
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Os breves exemplos ilustram o amplo campo de aplicação das tutelas antecipadas, essencialmente quanto ao requisito do periculum in mora.
Após a constatação de que uma determinada situação caracteriza o requisito do periculum in mora, cabe a pessoa advogada fundamentar a necessidade de antecipação dos efeitos da tutela com base no perigo da demora do provimento jurisdicional.
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Como fundamentar o periculum in mora?
Naturalmente, o fundamento do periculum in mora requer a apresentação de provas concretas que demonstrem o risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Nesse sentido, a prova é o ponto de partida.
Não há fórmula mágica para a fundamentação do periculum in mora. Compreendido o instituto e em sendo patente a necessidade de uma medida urgente, os elementos serão naturalmente demonstrados. De qualquer forma, é possível destacar algumas dicas para a fundamentação do periculum in mora:
- Descrever detalhadamente a situação de risco, com foco nas consequências da demora;
- Apresentar provas robustas quanto à existência do risco de dano irreparável;
- Destacar os prejuízos que a demora da decisão acarretaria;
- Referenciar precedentes relevantes de deferimento de medidas liminares em casos análogos.
Na maior parte dos casos, não se faz necessária uma digressão extensa a respeito dos requisitos do deferimento de tutelas provisórias, desde que os elementos essenciais de caracterização estejam presentes e suficientemente demonstrados.
Qual a diferença entre fumus boni iuris e periculum in mora?
O periculum in mora se refere ao risco de irreversibilidade do dano caso a medida não seja concedida, ao passo que o fumus boni iuris representa a confiabilidade na presunção de existência do direito alegado.
Periculum in mora e fumus boni iuris são os requisitos utilizados para avaliar a possibilidade de concessão de medidas emergenciais (tutelas provisórias) em processos judiciais.
Nesta altura do artigo, certamente você já sabe o que é o periculum in mora. Contudo, não foi tratado, de uma forma aprofundada, o fumus boni iuris, o outro requisito que, junto com o primeiro, é capaz de fundamentar o deferimento de uma medida liminar.
O fumus boni iuris é uma expressão latina que significa “fumaça do bom direito”. Este requisito está ligado à presunção de existência do direito invocado pelo requerente.
Em outras palavras, os fatos alegados e a tutela requerida devem, ao menos, aparentar robustez e validade suficientes para que a medida judicial seja adotada.
Ambos os requisitos devem estar presentes para que seja concedida a tutela provisória.
Conclusão
Em diversas demandas apresentadas aos operadores do direito, uma solução liminar e urgente é demandada, sob pena de que haja a ampliação ou mesmo a consolidação de danos irreversíveis. Para responder a estas demandas extremamente importantes, o sistema jurídico alicerçou o arcabouço das tutelas provisórias.
Por meio de decisões liminares, direitos que estão sob ameaça iminente de danos irreparáveis são resguardados. No entanto, as tutelas antecipadas não são utilizadas de forma indiscriminada, e devem ser concedidas tão somente quando preenchidos determinados requisitos.
Um destes requisitos foi o objeto de estudo do presente artigo. Trata-se do periculum in mora ou perigo da demora, que é caracterizado nas situações em que, não deferida a medida liminar, o direito a que se busca tutela poderá ser definitivamente violado, sem que se possa reverter o grave dano.
Ao longo do estudo, discorreu-se a respeito do seu conceito, de sua forma de caracterização, de exemplos práticos, de meios de fundamentar a sua existência e até mesmo a diferença do fumus boni iuris, outro requisito para o deferimento das tutelas provisórias.
O domínio do assunto, especialmente quanto à identificação das situações que podem ser revertidas por meio dos institutos de tutela provisória, é essencial para que o advogado ou a advogada preste um serviço de excelência na defesa dos direitos de seus clientes.
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Conheça as referências deste artigo
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil 3ª edição. Volume 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de processo civil anotado. 23. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020
Advogado (OAB 51419/SC). Sócio de Bertoncini, Gouvêa & Tissot Advogados, onde atua nas áreas de Direito Civil, Direito Empresarial, Direito dos Contratos, Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor. Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pós-graduado em...
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Só agradecer pelo artigo
Excelente artigo, Dr. Rodrigo. Parabéns pela clareza e concisão.