Built to Suit é uma modalidade de locação na qual um imóvel é construído ou adaptado sob medida para atender às necessidades específicas de um locatário.
Em um mercado imobiliário cada vez mais dinâmico e competitivo, o modelo Built to Suit se apresenta como uma solução eficiente e vantajosa para locações comerciais que buscam personalização e contratos longevos.
Imagine um cenário onde uma grande rede de varejo necessita de um centro de distribuição com características específicas para seu modelo de negócio. Construir ou adquirir um imóvel pode demandar tempo e recursos consideráveis.
É nesse contexto que o Built to Suit se apresenta como uma alternativa atrativa, permitindo que a empresa locatária tenha um imóvel sob medida, sem imobilizar capital em ativos fixos.
Neste guia completo, exploraremos os aspectos essenciais do Built to Suit, desde sua definição e características até os desafios e responsabilidades do advogado nesse tipo de contrato.
Abordaremos também jurisprudência relevante, fornecendo a você, advogado, as ferramentas necessárias para atuar com segurança e expertise nessa área.
Continue a leitura! 😉
O que é Built to Suit?
Built to Suit, que em português significa “construído para servir”, é uma modalidade de locação de imóvel não residencial (essencialmente comercial) na qual o locador constrói ou reforma um imóvel de acordo com as especificações do futuro locatário.
Esse modelo se diferencia da locação tradicional, pois o imóvel é concebido e adaptado para atender às necessidades específicas do locatário, como layout, dimensões, instalações e acabamentos.
Muitas vezes, a oferta do Built to Suit se dá em terrenos limpos. O proprietário oferece construir o imóvel do zero, conforme todas as especificações e necessidades indicadas pelo locatário, assumindo, inclusive, os custos das acessões e benfeitorias – que serão repassados ao locatário na modalidade de aluguel.
Nesse contexto, é comum e desejável que o próprio instrumento contratual inclua a especificação detalhada do imóvel, com plantas, memoriais descritivos e especificações técnicas, seja no corpo do contrato, seja através de anexos.
Por se tratar de uma atividade personalizada, é natural que o locador queira garantir uma relação de prazo alargado, acima de 20 anos, uma vez que, na saída do locatário, o imóvel servirá a poucos agentes econômicos e há necessidade de haver o retorno do investimento realizado na construção e adaptação do imóvel.
Quais são as características de um contrato Built to Suit?
Dada a sua natureza singular, os contratos Built to Suit exigem uma atenção meticulosa aos detalhes e uma compreensão profunda das nuances legais envolvidas.
Em primeiro lugar, há que proceder com a especificação detalhada do imóvel, abrangendo plantas baixas, elevações, memoriais descritivos, especificações técnicas e todos os elementos construtivos relevantes.
Como haverá, necessariamente, a realização de empreitadas por parte do locador, é crucial estabelecer uma cláusula sobre materiais e equipamentos. Isso é, especificar os materiais de construção, acabamentos internos e externos, instalações elétricas, hidráulicas e de telecomunicações, bem como quaisquer outros elementos que componham o imóvel.
O contrato deve se debruçar sobre a atividade econômica a ser desenvolvida e assegurar que o imóvel seja construído em conformidade com todas as normas legais e técnicas aplicáveis. Por exemplo, o Built to Suit de um hospital deverá prever a construção segundo as normas da Vigilância Sanitária.
A duração de um Built to Suit é alargada, normalmente acima de 20 anos, para garantir o retorno do investimento do locador e a amortização dos custos de construção.
Ocorre que muitos fatos podem ocorrer em um período tão longo a fim de ensejar o reequilíbrio econômico do contrato. Nesse sentido, é fundamental prever cláusulas de revisão de contrato que não ensejem a rescisão plena. Alternativamente, é preciso prever, expressamente, a proibição da revisão do contrato.
O STJ já se manifestou sobre o tema em duas ocasiões. Na primeira delas, autorizando a ação revisional do contrato de aluguel, observadas determinadas condições. Na segunda deles, autorizando a renúncia expressa ao direito de revisão. Confira-se os destaques:
REsp 2.042.594/SP: Possibilidade de ação revisional de aluguel em contrato built to suit, desde que: (i) não haja renúncia ao direito de revisão; (ii) seja possível pormenorizar a parcela destinada a remunerar exclusivamente o uso do imóvel; e (iii) esteja comprovada a desproporção entre o valor do locativo e o preço de mercado.
REsp 1.637.997/SP: É lícita a cláusula que prevê a renúncia ao direito de revisão do aluguel em contrato built to suit, desde que expressa e clara.
Considerando as limitações referentes aos reajustes contratuais, o valor do aluguel deve ser definido com base no custo da construção, na localização do imóvel, nas condições de mercado e nas especificações acordadas.
Ainda, o contrato deve especificar os índices que serão utilizados para reajustar o valor do aluguel periodicamente, como o Índice Geral de Preços (IGP-M) ou o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
É importante estabelecer um cronograma de manutenção preventiva para garantir a conservação do imóvel e evitar problemas futuros, bem como estipular a responsabilidade sobre os reparos e os danos causados ao imóvel, incluindo a responsabilidade financeira e os prazos para a realização dos reparos.
Se o locador desejar repassar alguns dos custos da obra ou reparo ao locatário, poderá fazê-lo com incentivos financeiros, como carência de aluguel.
Nada obstante as peculiaridades do Built to Suit, fato é que ele possui natureza típica de locação, como já decidiu o STJ (REsp 1.723.377/SP). Assim, as demais cláusulas esperadas em um contrato de locação comercial deverão estar presentes:
- GarantiaS;
- Hipóteses de rescisão
- Responsabilidade pelo recolhimento de tributos;
- Contratação de seguro, etc.
Para resumir, elaboramos uma tabela com as principais diferenças entre o contrato Built to Suit e a locação convencional:
Característica | Built to Suit | Aluguel Tradicional |
Imóvel | Construído ou adaptado sob medida | Existente no mercado |
Prazo do contrato | Longo prazo | Curto ou longo prazo |
Personalização | Alta | Baixa ou nula |
Investimento inicial do locatário | Baixo | Pode ser alto (adaptações) |
Flexibilidade | Menor | Maior |
Quais são as vantagens do modelo Built to Suit?
O Built to Suit oferece vantagens significativas para locatários e locadores.
Do ponto de vista do locatário, estará obtendo um imóvel “sob medida”, que atende perfeitamente às suas necessidades, otimizando suas operações. Igualmente, elimina a necessidade de investir na compra de um imóvel e em custos de adaptações, garantindo uma redução de custos.
Com isso, permite-se ao locatário concentrar seus recursos e esforços em seu core business.
Por sua vez, o Built to Suit é interessante ao locador, na medida em que garante segurança de renda, valorização do imóvel e redução de vacância. Isso é, tem-se um fluxo financeiro estável e previsível, acompanhando a valorização decorrente dos investimentos, bem como vincula o locatário por maior período.
É certo, porém, que nem todos os setores verão utilidade nessa forma de aluguel. Os principais focos do Built to Suit são:
- Áreas de varejo, como supermercados, lojas de departamento;
- Logística, como centros de distribuição e armazéns;
- Indústria, como fábricas e unidades produtivas;
- Hhospitais e clínicas.
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Como funciona um contrato Built to Suit?
O processo de um contrato Built to Suit geralmente envolve seis etapas.
Primeiro, a identificação da necessidade, na qual o locatário define suas necessidades e requisitos para o imóvel.
Em seguida, ocorre a procura por um locador capaz de desenvolver o projeto.
A terceira etapa consiste na negociação e elaboração do contrato, onde as partes negociam as condições e formalizam o acordo.
A quarta etapa é a construção ou adaptação do imóvel, realizada pelo locador de acordo com as especificações do contrato.
Na quinta etapa, o locador entrega o imóvel ao locatário após a conclusão da obra.
Por fim, a sexta etapa é a gestão do contrato, na qual as partes cumprem suas obrigações durante a vigência do contrato.
Quais são os riscos e desafios em contratos Built to Suit?
Os contratos Built to Suit, apesar de suas vantagens, apresentam desafios intrínsecos que requerem uma abordagem estratégica e meticulosa. A complexidade desses contratos exige não apenas conhecimento técnico, mas também experiência em negociações.
A complexidade contratual decorre da enorme plêiade de riscos existente em uma relação multifásica e de longo prazo.
Em primeiro lugar, há o risco de empreitada. É comum que o locatário tenha uma expectativa de conclusão da obra para que passe a operar no menor tempo possível. Por outro lado, podem ocorrer atrasos na obra decorrentes da falta de mão de obra, ausência de materiais ou atrasos com fornecedores.
Esses fortuitos, porém, são considerados como elementos internos à operação e não desoneram o proprietário que, muitas vezes, acaba sujeito a multas expressivas por falhas de terceiros.
Aumentos expressivos no custo da obra são impostos exclusivamente ao dono da obra que, por sua vez, pode estabelecer uma cláusula de reajuste contratual em mudanças mais expressivas.
Mesmo quando a obra é concluída adequadamente os alugueis estão regulares, há o risco de insolvência do inquilino. Se a atividade comercial sofrer depressões, é possível que o locatário interrompa os pagamentos antes mesmo do pay back da construção.
Em vista disso, é fundamental que o proprietário colacione garantias contratuais – com destaque para as financeiras, como o seguro-fiança – que viabilizem a rescisão contratual sem o custo da cobrança judicial.
Quais as responsabilidades do advogado em um contrato Built to Suit?
Em um universo contratual complexo como no Built to Suit, a presença de um advogado se revela imprescindível em cada uma das etapas.
A atividade do advogado se inicia desde a consultoria jurídica, com a orientação do cliente sobre os aspectos legais e riscos do contrato e se estende pela participação nas rodadas de negociação, elaboração e revisão do contrato.
Recomenda-se, ainda, que o advogado acompanhe a gestão contratual, antecipando riscos e mediando a resolução do conflito de modo preventivo. Se isso não for suficiente, caberá ao advogado representar uma das partes no Poder Judiciário.
Julgados sobre Built to Suit:
A jurisprudência brasileira sobre Built to Suit ainda está em desenvolvimento, mas já existem decisões relevantes que orientam a interpretação dos contratos e a resolução de conflitos. Separamos alguns destaques de julgados do STJ.
REsp 2.042.594/SP (2023): Possibilidade de ação revisional de aluguel em contrato built to suit, desde que: (i) não haja renúncia ao direito de revisão; (ii) seja possível pormenorizar a parcela destinada a remunerar exclusivamente o uso do imóvel; e (iii) esteja comprovada a desproporção entre o valor do locativo e o preço de mercado.
REsp 1.723.377/SP (2018): A natureza jurídica do contrato built to suit é de locação, não se configurando como compra e venda ou promessa de compra e venda.
REsp 1.637.997/SP (2016): É lícita a cláusula que prevê a renúncia ao direito de revisão do aluguel em contrato built to suit, desde que expressa e clara.
REsp 1.435.947/SP (2014): Em caso de rescisão antecipada do contrato built to suit por culpa do locatário, é devida a indenização ao locador pelos investimentos realizados na construção do imóvel.
REsp 1.189.180/SP (2010): O contrato built to suit se caracteriza pela construção ou reforma de imóvel sob medida para atender às necessidades do locatário, mediante a celebração de contrato de locação de longo prazo.
Conclusão:
O Built to Suit se consolida como uma ferramenta estratégica no mercado imobiliário, oferecendo soluções personalizadas e eficientes para empresas de diversos setores.
A complexidade dos contratos e os desafios inerentes ao modelo exigem a atuação de advogados especializados, capazes de orientar, negociar e defender os interesses de seus clientes.
A compreensão dos aspectos jurídicos, a análise da jurisprudência e a atenção aos detalhes do contrato são fundamentais para o sucesso das operações Built to Suit.
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Conheça as referências deste artigo
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Contratos. Salvador: Juspodivm, 2017.
Advogado (OAB 97692/PR). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná - UFPR e Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pela PUC/PR. Sou membro do Núcleo de Pesquisas em Políticas Públicas e Desenvolvimento Humano (NUPED) e sócio fundador da Martinelli...
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