A cessão de crédito é um instrumento jurídico pelo qual o credor transfere seus direitos de receber pagamentos de um devedor para um terceiro. Essa operação é muito utilizada em transações comerciais e financeiras para a transferência de recebíveis, permitindo ao terceiro receber os pagamentos devidos pelo devedor.
A cessão de crédito é um instrumento jurídico complexo que desempenha um papel fundamental em transações comerciais e financeiras. Por meio dela, agentes econômicos podem ceder a posição creditícia em favor de um terceiro. Tal possibilidade, em diversos casos, pode ser muito interessante e lucrativa.
Não são raras as situações em que conglomerados empresariais, pequenas e médias empresas, instituições financeiras e indústrias se vêem em situações nas quais seus caixas estão “esvaziados”, ainda que detenham uma relevante quantia de dinheiro a ser recebida, em parcelamentos, por operações avançadas com devedores.
Nestas hipóteses, a cessão de crédito pode servir como forma de garantir liquidez por meio da transferência de seus créditos a um terceiro, que “adiantarão” os recebíveis, geralmente, com um deságio (diminuição do valor de um título).
A cessão de crédito, no entanto, deve observar alguns requisitos e algumas cautelas, de modo que suas disposições sejam válidas e eficazes entre as partes e perante terceiros.
Neste artigo vamos explorar a cessão de crédito, explicando o seu funcionamento, seus requisitos, a diferença entre a cessão de crédito e de débito e as situações em que a cessão de crédito não é permitida.
Como o tema é bastante complexo e objeto de diversos estudos acadêmicos, não pretendemos esgotar o assunto, mas tão somente destacar os aspectos essenciais para a compreensão do instituto e para o uso prático no cotidiano da advocacia. Continue a leitura!
O que é cessão de crédito?
A cessão de crédito é um negócio jurídico que envolve a transferência de direitos de recebimento de um credor (cedente) para um terceiro (cessionário).
Este terceiro, agora detentor dos direitos creditórios, passa a ter o direito de receber pagamentos do devedor original (devedor cedido). Esta cessão de crédito pode ser total ou parcial, dependendo do acordo entabulado entre as partes.
Em termos práticos: digamos que Maria seja devedora de José, na quantia de R$ 1.000,00. José possui um direito de crédito contra Maria no montante acima descrito. Pela operação de cessão de crédito, José (cedente) pode ceder a totalidade ou parte do crédito para João (cessionário), que passará a ser credor de Maria (devedora cedida).
No entanto, a cessão de crédito não ocorre apenas como no exemplo acima. Pelo contrário, ela funciona como um importante instrumento de circulação de riquezas em complexas operações comerciais.
São frequentes as relações creditícias entre empresas. No momento em que um determinado credor demanda liquidez, costuma ceder parte dos seus créditos – ainda que com um certo deságio – para um terceiro que, ao assumir a posição do cedente, o remunera.
Assim, o cedente garante a sua liquidez e o cessionário adquire os direitos de crédito por um valor descontado, possibilitando que aufira um proveito econômico futuro.
Por exemplo: imagine que uma empresa A tenha em sua posse um contrato de empréstimo de R$ 1.000.000,00, em que é devedora a empresa B. A empresa A, necessitando de liquidez imediata, decide ceder os direitos de recebimento dos pagamentos mensais da empresa B para uma instituição financeira C, pelo valor de R$ 900.000,00. Agora, C torna-se o credor dos pagamentos da empresa B, de acordo com os termos originais do contrato celebrado entre A e B.
Como funciona a cessão de crédito?
O processo de cessão de crédito inicia com a elaboração de um contrato de cessão, no qual as partes estabelecem os termos e condições da transferência do crédito.
Esse contrato deve especificar claramente o valor do crédito cedido, as datas de pagamento, as obrigações de notificação ao devedor cedido, o preço e outras condições relevantes.
Ajustados os termos da cessão de crédito entre cedente e cessionário, torna-se essencial que o cedente notifique o devedor cedido a respeito da cessão. Isto porque, na prática, o cedente é o detentor originário do crédito cedido, devendo ele informar o seu devedor a respeito da mudança de titularidade do crédito.
Feita a notificação, o devedor possui a obrigação legal de realizar os pagamentos diretamente ao cessionário (novo credor), de acordo com os termos do contrato de cessão e do contrato originário, estabelecido entre devedor e cedente.
Leia também: Como funciona a Cessão de Direitos Hereditários?
Quais são os requisitos da cessão de crédito?
A cessão de crédito está disciplinada, de forma preliminar, no art. 286 do Código Civil:
Determinados requisitos devem ser observados para que a cessão de crédito seja considerada válida. Confira quais são alguns dos requisitos:
- Inexistência de impedimentos legais ou contratuais;
- Celebração de um negócio jurídico que define as condições da cessão;
- Determinação de um crédito líquido, certo e exigível, ou seja, o crédito deve ser claramente definido, quantificado e “cobrável”;
- As partes envolvidas devem ter plena capacidade para celebração do contrato de cessão;
- Envio adequado de notificação informando o devedor cedido a respeito da cessão, de modo que ele saiba a quem efetuar os próximos pagamentos.
Via de regra, a cessão de crédito não se reveste de forma solene, ou seja, não deve obedecer um rito formal determinado. Contudo, para que tenha eficácia diante de terceiros, a cessão deve ser realizada mediante instrumento público ou instrumento particular que obedeça aos ditames do art. 654, §1º, do Código Civil, que disciplina o mandato.
No que toca à notificação do devedor cedido, não se trata de requisito de validade do negócio jurídico de cessão, mas sim de eficácia com relação ao próprio devedor. Isto porque, naturalmente, inexistindo a notificação do devedor, este continuará a cumprir as suas obrigações diante do contratante originário, ora cedente.
Por isso, caso o devedor cedido, depois da celebração da cessão de crédito entre cedente e cessionário, mas antes de sua efetiva notificação, realize pagamento em favor do cedente, a parcela será considerada quitada. Trata-se de decorrência da boa-fé objetiva e da inexigibilidade de conduta diversa do devedor, que não tem a obrigação de descobrir, por si, a existência da cessão de crédito.
Ressalte-se, no ponto, que o devedor não deve anuir com a cessão de crédito, mas tão somente ser cientificado a respeito de sua ocorrência.
A concordância do devedor é absolutamente desnecessária na medida em que o crédito cedido pertence a um terceiro, sendo sua obrigação apenas adimplir com as obrigações anteriormente assumidas diante do credor originário.
Leia também: Princípios e aspectos gerais dos títulos de crédito que advogados precisam saber
Existe diferença entre cessão de crédito e débito?
São significativas as diferenças entre cessão de crédito e cessão de débito, saiba um pouco mais sobre as características de cada uma:
Cessão de crédito
A cessão de crédito envolve a transferência de direitos de recebimento de um credor para um terceiro. O credor original se torna o cedente e o terceiro se torna o cessionário. O devedor cedido, por sua vez, permanece o mesmo, e o cessionário passa a ter o direito de receber os pagamentos;
Cessão de débito
A cessão de débito, ou assunção de dívida, por outro lado, envolve o repasse de obrigações do devedor para um terceiro. Ou seja, o devedor original se torna o cedente e o terceiro se torna o cessionário. Assim, o devedor cessionário deve cumprir as suas obrigações perante o credor cedido.
Diferentemente da cessão de crédito, na assunção de dívida (cessão de débito) o credor cedido deve concordar expressamente com a operação, eis que o devedor do seu crédito está sendo alterado.
Em última instância, alterar o devedor pode representar, para um credor, um incremento em risco do crédito, já que não se sabe se o novo devedor possui as mesmas condições/liquidez do devedor originário.
Leia também: O que é e quais são os requisitos da ação de cobrança no Novo CPC
Mais liberdade no dia a dia
Em quais situações não pode haver a cessão de crédito?
Ainda que a cessão de crédito seja uma ferramenta importante na circulação de riquezas, existem situações em que ela não é permitida. Alguns cenários de proibição da cessão de crédito incluem:
- Vedação contratual: caso o contrato originário, entre credor e devedor, proíba expressamente a cessão de crédito, a transferência do direito não deverá ser realizada;
- Restrições legais: existem determinados créditos que não são passíveis de cessão, como o crédito decorrente de pensões alimentícias. No mesmo sentido, tutores e curadores não podem ser cessionários de seus pupilos e curatelados.
- Ausência de capacidade: por ser, inclusive, uma hipótese de invalidade do negócio jurídico, não é viável a cessão de crédito que envolva agentes incapazes.
Leia também: Confira quais as causas da suspensão da exigibilidade do crédito tributário
Conclusão:
A cessão de crédito é um instrumento jurídico vital nas relações comerciais e financeiras. Compreender seu funcionamento, requisitos e implicações é essencial para viabilizar operações seguras.
Seja na gestão de passivos, no financiamento de projetos ou mesmo em transações financeiras tradicionais, a cessão de crédito desempenha um papel significativo no universo empresarial.
Por isso, é extremamente importante que os profissionais estejam amplamente familiarizados com tudo o que envolve a cessão de crédito, especialmente quanto aos seus requisitos e à necessidade de notificação do devedor.
O artigo buscou elucidar os temas essenciais relacionados à cessão de crédito, sem pretender esgotar o tema. Colocamo-nos à disposição para complementar e esclarecer questões que eventualmente surjam a partir da leitura!
Mais conhecimento para você
Se você gostou deste texto e deseja seguir a leitura em temas sobre direito e advocacia, vale a pena conferir os seguintes materiais:
- Entenda o que é antitruste e suas principais características
- O que diz a legislação brasileira sobre o aborto? – art 124 do CP
- Entenda o que é e quem tem direito ao benefício de prestação continuada
- Entenda o que é a Lei Anticorrupção e qual o seu objetivo no Brasil
- Entenda o que é antitruste e suas principais características
- Entenda o que é e como funciona a anulação de casamento
- Reforma da previdência: o que muda e como ela pode acelerar o desenvolvimento do seu escritório
- Consignação em pagamento: o que é e quando é cabível
- O que diz a Lei 14.457/22 e qual sua importância
- Direito de defesa: o que é e qual a sua importância
Este conteúdo foi útil pra você? Conta aqui nos comentários 😉
Assine grátis a Aurum News e receba uma dose semanal de conteúdo no seu e-mail! ✌️
Conheça as referências deste artigo
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelsonl. Curso de Direito Civil. 17. ed. Volume 2. São Paulo: IusPodivm, 2023.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Volume 2. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2023.
Advogado (OAB 51419/SC). Sócio de Bertoncini, Gouvêa & Tissot Advogados, onde atua nas áreas de Direito Civil, Direito Empresarial, Direito dos Contratos, Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor. Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pós-graduado em...
Ler maisDeixe seu comentário e vamos conversar!
Eu tinha uma dívida atrasada há 1 ano, e recentemente vi que na fatura apareceu cessão de carteira e diferença da cessão de carteira, mais eu não fui comunicada sobre essa mudança nem nada, como eu devo prosseguir?