A intervenção de terceiros permite que pessoas que não integram originalmente uma ação possam ingressar no processo para defender seus interesses. Medida essa que possibilita a ampliação do contraditório e pode impactar diretamente o desfecho da demanda.
Imagine que você tem um contrato de seguro e, por algum motivo, precise processar a seguradora para obter indenização por um sinistro que deveria ter sido coberto, mas lhe foi negado.
Nesse caso, a seguradora pode querer chamar ao processo um terceiro responsável pelo sinistro para evitar ser condenada sozinha.
Esse é apenas um exemplo de intervenção de terceiros, um mecanismo fundamental para garantir que todos os envolvidos possam se manifestar no curso do processo.
A intervenção de terceiros no NCPC tem como objetivo permitir que pessoas que não são partes originais da ação participem do processo, seja para defender seus próprios interesses, auxiliar uma das partes ou evitar prejuízos futuros.
No Código de Processo Civil, foram estabelecidas cinco modalidades principais de intervenção de terceiros, cada uma com suas especificidades e requisitos próprios, conforme previsto nos artigos 119 a 138 do Código de Processo Civil.
Continue a leitura para entender mais sobre o tema! 😉
O que é intervenção de terceiros?
A intervenção de terceiros ocorre quando alguém que não faz parte de um processo judicial ingressa na ação para defender um interesse próprio, de uma das partes ou para colaborar na decisão do juiz. Ela pode ser voluntária ou compulsória.
Art. 119. Pendendo causa entre 2 (duas) ou mais pessoas, o terceiro juridicamente interessado em que a sentença seja favorável a uma delas poderá intervir no processo para assisti-la.
Parágrafo único. A assistência será admitida em qualquer procedimento e em todos os graus de jurisdição, recebendo o assistente o processo no estado em que se encontre.
Modalidades de intervenção de terceiros:
O Código de Processo Civil traz para nós algumas modalidades em que podem ocorrer a intervenção de terceiros, podendo ser por meio da assistência, oposição, chamamento ao processo ou amicus curiae.
Confira cada modalidade:
Assistência
A assistência ocorre quando um terceiro ingressa no processo para auxiliar uma das partes, pois possui interesse jurídico na solução da lide. Para tanto, é necessário que haja a comprovação do interesse jurídico do terceiro, não bastando, para tanto, o mero interesse econômico.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO POPULAR – INTERVENÇÃO DE TERCEIROS – PEDIDO DE ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL – ART. 124 DO CPC – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE INTERESSE JURÍDICO – MERO INTERESSE ECONÔMICO – DECISÃO MANTIDA. 1. A intervenção de terceiros ocorre quando alguém ingressa, como parte ou coadjuvante da parte, em processo pendente entre outras partes, sendo a assistência uma das modalidades previstas no diploma processual civil. 2. A assistência litisconsorcial exige a comprovação do interesse jurídico direto do pretenso assistente, ou seja, a demonstração que é o titular da relação jurídica discutida nos autos, cotitular da situação jurídica ou colegitimado extraordinário. 3. Não evidenciando nos autos o interesse jurídico para o seu ingresso no processo em andamento, mas, na realidade, mero interesse econômico, descabe o deferimento da assistência litisconsorcial. 4. Recurso conhecido e não provido. (TJ-MG – AI: 10000180629271005 MG, Relator.: Fausto Bawden de Castro Silva (JD Convocado), Data de Julgamento: 07/06/2022, Câmaras Cíveis / 9ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 13/06/2022)
Além disso, como podemos verificar na referida situação, o Il. Relator Fausto Bawden utiliza a expressão assistência litisconsorcial, isso porque, o código de processo civil realiza uma distinção dentro da assistência, podendo ser ela simples ou litisconsorcial, como veremos a seguir:
Assistência simples
Ocorre quando o assistente não tem relação jurídica direta com o objeto do processo, mas pode ser afetado pela decisão.
Art. 121. O assistente simples atuará como auxiliar da parte principal, exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido.
Parágrafo único. Sendo revel ou, de qualquer outro modo, omisso o assistido, o assistente será considerado seu substituto processual.
Para fins de melhor visualização do vosso caro leitor, a assistência simples é um típico caso em que um fiador pode intervir em uma ação entre credor e devedor, tendo em vista que o resultado pode afetar sua obrigação de pagamento.
Assistência litisconsorcial
A assistência litisconsorcial ocorre quando o terceiro tem uma relação jurídica direta com a parte assistida, tornando-se, na prática, um co-litigante.
Art. 124. Considera-se litisconsorte da parte principal o assistente sempre que a sentença influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido.
Denunciação da lide
Essa modalidade ocorre quando uma das partes chama um terceiro para o processo a fim de resguardar um direito de regresso ou quando há a transferência do domínio da coisa objeto da lide. É comum em relações contratuais que envolvem responsabilidade de terceiros.
Art. 125. É admissível a denunciação da lide, promovida por qualquer das partes:
I – ao alienante imediato, no processo relativo à coisa cujo domínio foi transferido ao denunciante, a fim de que possa exercer os direitos que da evicção lhe resultam;
II – àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem for vencido no processo.
Nesse mesmo sentido, o STJ também já se manifestou impondo limites a denunciação a lide, vejamos:
AGRAVO INTERNO EM AGRAVO RECURSO ESPECIAL. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. PRETENSÃO DE TRANSFERIR A OUTREM A RESPONSABILIDADE PELO EVENTO DANOSO. NÃO CABIMENTO DA DENUNCIAÇÃO . APLICAÇÃO DO ART. 125, I, DO NOVO CPC. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte Superior, o Código de Processo Civil de 2015 não prevê a obrigatoriedade da denunciação da lide em nenhuma de suas hipóteses. Ao contrário, assegura o exercício do direito de regresso por ação autônoma quando indeferida, não promovida ou proibida ( CPC/2015, art 125, caput, e § 1º). 2. Consoante orientação do STJ, “não se admite a denunciação da lide com fundamento no art . 125, II, do CPC se o denunciante objetiva eximir-se da responsabilidade pelo evento danoso, atribuindo-o com exclusividade a terceiro” (AgInt no AREsp 1.483.427/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24//2019, DJe 30/9/2019) . 3. O Tribunal estadual entendeu pelo não cabimento da denunciação da lide aos fundamentos de que não é obrigatória no presente caso e de que o objetivo do denunciante é eximir-se da obrigação, atribuindo a responsabilidade dos danos causados no acidente, com exclusividade a terceiro. 4. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com o entendimento consolidado no STJ, não merecendo reforma. Incidência da Súmula 83/STJ. 5. Agravo interno não provido. (STJ – AgInt no AREsp: 1850758 RJ 2021/0063671-9, Relator.: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 30/08/2021, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/09/2021).
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Nesse caso, o Réu poderia alegar sua ilegitimidade passiva ao invés da denunciação a lide.
Então, onde podemos visualizar esse direito? Ora, basta-nos imaginar uma incorporadora que, ao ser processada por um condomínio devido a defeitos na obra, pode denunciar a lide à construtora que é obrigada contratualmente a indenizar em ação de regresso, caso entenda que a responsabilidade pelos defeitos é dela.
Chamamento ao processo
Ocorre quando o réu chama ao processo outros coobrigados, normalmente em casos de obrigação solidária. Isso garante que todos os responsáveis pela dívida ou obrigação participem da ação desde o início, evitando múltiplas demandas judiciais.
Seria o caso de uma ação de cobrança contra um dos devedores solidários, este pode chamar os demais para o processo, garantindo que a dívida seja dividida entre todos os responsáveis.
Amicus Curiae
O amicus curiae, ou “amigo da corte”, é uma figura que ingressa no processo para fornecer subsídios técnicos ou jurídicos ao julgador. Sua participação é voluntária e ocorre em casos que tenham relevância social, econômica ou jurídica.
Oposição
Por fim, temos a figura da oposição, que por mais que não esteja englobada no capítulo de intervenção de terceiros do Código de Processo Civil, também é uma manifestação realizada por um terceiro interessado.
Ela acontece quando um terceiro ingressa no processo alegando que tem direito sobre o bem ou objeto da disputa entre autor e réu.
Art. 682. Quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu poderá, até ser proferida a sentença, oferecer oposição contra ambos.
Art. 683. O opoente deduzirá o pedido em observação aos requisitos exigidos para propositura da ação.
Seria o caso de imaginarmos um colecionador de arte que se opõe a um processo entre duas pessoas que brigam pela posse de um quadro raro, alegando que ele é o verdadeiro dono da obra.
Mais liberdade no dia a dia
Quando é possível a intervenção de terceiros?
Cada modalidade de intervenção tem momentos específicos em que pode ser requerida. Algumas exigem pedido formal da parte interessada, enquanto outras podem ser determinadas pelo próprio juízo. O importante é que a intervenção seja pertinente e contribua para a solução do caso.
Além disso, é necessário observar que existem algumas jurisprudências tratando da impossibilidade da intervenção de terceiros, como por exemplo, em sede de execução e nos juizados especiais.
PROCESSO CIVIL. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS. IMPOSSIBILIDADE NO RITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS. 1) Em razão dos princípios da informalidade e da celeridade, o rito dos Juizados Especiais cíveis impede a intervenção de terceiros, nos termos do art. 10 da lei 9.099/1005 que assim dispõe: “Não se admitirá, no processo, qualquer forma de intervenção de terceiro nem de assistência (…)”. 2) Da norma, observa-se que o diploma legal objetiva impedir a ampliação dos limites subjetivos da ação, uma vez que os Juizados Especiais têm por finalidade precípua a rápida solução da lide. 3) Recurso conhecido e não provido. 5) Sentença mantida. (TJ-AP – RI: 00006857620198030003 AP, Relator.: JOSÉ LUCIANO DE ASSIS, Data de Julgamento: 02/07/2020, Turma recursal)
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL – AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO – INSURGÊNCIA RECURSAL DO AGRAVANTE. 1. Este Superior Tribunal tem se posicionado no sentido de não ser cabível intervenção de terceiros em fase de execução. Precedentes.1.1. Não sendo o caso de assistência litisconsorcial, deve ser mantida a conclusão no sentido de inadmitir a pretensão recursal de incluir terceiro no polo passivo dos embargos à execução, sob pena de se permitir a criação de procedimento não previsto em lei. 2. Agravo interno desprovido. (STJ – AgInt nos EDcl no REsp: 1999943 GO 2022/0125509-7, Relator.: MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 12/06/2023, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/06/2023).
Diferença entre litisconsórcio e intervenção de terceiros:
O litisconsórcio ocorre quando há mais de uma parte litigando no mesmo polo da ação (seja passivo ou ativo) desde o início do processo, enquanto a intervenção de terceiros permite a entrada de novos interessados no curso da demanda.
Enquanto o litisconsórcio é inerente ao processo, a intervenção de terceiros depende de requerimento ou previsão legal.
Impacto da intervenção de terceiros em processos judiciais:
A inclusão de terceiros em um processo pode gerar diversos impactos, podendo ser positivos ou negativos a depender da situação de cada processo e da modalidade.
Vemos que a intervenção de terceiro pode gerar:
Maior abrangência da decisão
A presença de terceiros evita que uma decisão judicial seja tomada sem considerar todos os interessados, reduzindo a possibilidade de novas ações sobre o mesmo tema.
Prevenção de litígios futuros
Muitas intervenções (como a denunciação da lide e o chamamento ao processo) ajudam a resolver em um único processo todas as disputas relacionadas ao caso, economizando tempo e recursos.
Aprofundamento do debate jurídico
A entrada de terceiros pode trazer novas perspectivas e informações técnicas, auxiliando o juiz na tomada de decisões mais justas e embasadas, caso esse que temos com o amicus curiae.
Aumento da complexidade do processo
A intervenção de terceiros pode ampliar o número de argumentos e provas a serem analisadas, prolongando a tramitação da ação.
Risco de tumulto processual
Em alguns casos, intervenções podem ser usadas apenas como estratégia protelatória, atrasando a resolução da demanda.
Conclusão:
A intervenção de terceiros pode ser essencial para garantir um julgamento mais justo e completo, mas deve ser utilizada com critério para evitar complicações e uma complexidade desnecessária, por isso dá importância aos profissionais do direito tomarem decisões estratégicas e assertivas.
Ela se trata de um instituto fundamental para garantir a ampla defesa e a efetividade do processo. Conhecer suas modalidades e aplicabilidades permite que advogados e partes protejam melhor seus interesses!
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