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Código Penal Militar: o que diz e principais diferenças do Código Penal

Código Penal Militar: o que diz e principais diferenças do Código Penal

6 dez 2023
Artigo atualizado 1 fev 2024
6 dez 2023
ìcone Relógio Artigo atualizado 1 fev 2024
O Código Penal Militar (CPM) é um conjunto de leis que regem as condutas criminosas no âmbito das Forças Armadas. 

O Código Penal Militar é um documento fundamental para a manutenção da ordem e disciplina militares, possuindo semelhanças e diferenças significativas com o Código Penal Comum. 

Neste texto, exploraremos os principais conceitos relacionados ao CPM, incluindo  uma análise comparada com o chamado “direito penal comum”, critérios de aplicação e exemplo prático. Continue a leitura! 😉

O que diz o Código Penal Militar?

O Código Penal Militar guarda inúmeros pontos em comum com o Código Penal propriamente dito. Por exemplo: tempo, local do crime e leis penais temporárias.

A primeira diferença entre ambos os diplomas está na existência de critérios específicos relacionados com sujeito ativo, vítima e contexto do crime que sujeitam a aplicação do Código Penal Militar no caso concreto. 

Trata-se de quesitos que, uma vez não preenchidos, atraem a competência da justiça comum para análise e processamento do feito. Além disso, tratando-se de critério absoluto de competência em razão de matéria, essas questões não se prorrogam no tempo por decorrência de inércia da parte interessada, contaminando o feito como um todo e produzindo sua nulidade.

Entenda o que diz o Código Penal Militar
Veja o que é o Código Penal Militar

Quais são os crimes militares?

No que diz respeito ao sujeito ativo, os crimes militares são aqueles praticados por servidores do serviço ativo das forças armadas, por membros reformados e até mesmo por civis, desde que preenchidas condições específicas relacionadas com vítima e lugar. 

Não basta, portanto, que o sujeito ativo do delito seja militar da ativa, considerando a possibilidade de imputação da conduta também ao reformado e ao civil. No caso, se revela necessário a análise se o delito foi praticado contra militar ou contra a administração militar, como no caso de aeronaves, embarcações, ou dentro de quartéis, bases, depósitos de suprimentos, dentre outros (artigos 9º e 10º).

Além disso, os crimes militares, diferente dos delitos comuns, são divididos entre aqueles praticados em tempo de paz e de guerra, sendo estes últimos sujeitos a aumento de 1/3 em eventual pena aplicada (artigo 20).

Outro ponto relevante na legislação penal militar é a existência de crimes e condições específicas relacionadas com a hierarquia das forças armadas, ou seja, havendo um tratamento jurídico específico ou diferenciado quando a conduta é praticada contra superior hierárquico ou por ordem oriunda dele.

Tem pena de morte no Código Penal Militar?

Com relação as penas, observa-se não apenas a já conhecida possibilidade de aplicação da pena de morte para delitos graves praticados em tempo de guerra, já abordada na própria Constituição Federal (art. 5º, XLVII). 

O dispositivo possibilita, também, a aplicação de outras sanções não previstas na legislação penal comum como:

  •  Impedimento: não deixar o local da unidade;
  • Suspensão: do exercício do cargo, posto ou função;
  • Reforma: inatividade.

A seguir, a análise comparada se mostra uma metodologia mais adequada para este ponto do presente artigo, eis que os dispositivos a serem abordados guardam relação com disposições semelhantes na legislação penal comum.

Ainda com relação ao tópico da pena, existe a possibilidade de aplicação de pena por tempo indeterminado (art. 78), algo possível na legislação penal comum apenas para as medidas de segurança. 

No entanto, esta pena indeterminada não pode ter duração inferior a 3 anos ou superior a 10, ou seja, não se trata de uma pena de caráter perpétuo propriamente dito, o que tornaria a norma incompatível com a CF/88, mas uma pena aplicada sem um termo fixo para o caso de criminosos habituais. 

Desta forma, ao tempo em que na legislação penal comum o acusado sabe a quantidade exata de pena a ser a ele aplicada, no caso de uma pena de tempo indeterminado o condenado sabe apenas o tempo mínimo e máximo que ficará privado de sua liberdade, sem uma dosimetria exata.

Neste caso há que se questionar nesta categoria de pena o respeito ao princípio da proporcionalidade, presente no direito penal comum, entre a conduta praticada e a sanção a ser aplicada, não sendo possível se falar na sua presença quando inexistente uma correspondência precisa entre o ato praticado, sua gravidade e a sanção. 

As penas indeterminadas, como consequência, acabam por se desprenderem das conhecidas funções de prevenção e retribuição, cediças ao direito penal comum, passando a adotar um papel de política criminal, ou seja, o condenado, criminoso habitual, é retirado do convívio social por tempo indeterminado (mas delimitado em seu mínimo e máximo) na clara intenção de que não volte a delinquir.  

A pena perde a sua função de punir, de retribuir proporcionalmente o mau causado por meio da aplicação de uma sanção (privação de liberdade, multa, penas alternativas) e passa a prevenir a reincidência por meio da privação do direito à liberdade por tempo indeterminado.

Código Penal Militar comentado:

Confira alguns instrumentos presentes no Código Penal Militar que possuam dispositivo similar na legislação penal comum:

Suspensão condicional da execução da pena: 

Duração de 02 a 06 anos (art. 84), em face do limite de 04 anos da legislação penal comum (art. 77). 

Ambos se submetem ao mesmo quesito de dosimetria (pena inferior a 02 anos) porém existem regras específicas para aplicação do benefício como a vedação para crimes praticados em tempo de guerra, insubordinação e desrespeito aos símbolos nacionais.

Livramento condicional (art. 89): 

Possível a partir do cumprimento de metade da pena (primário) ou 2/3 (reincidente). No Código Penal os prazos são de 1/3 e metade, respectivamente (art. 83). 

Observa-se, assim, lapsos mais rígidos na legislação penal militar para a concessão do benefício, alinhado com a maior gravidade esperada para crimes sujeitos à sua jurisdição.

Obediência hierárquica (art. 38): 

Trata-se de excludente da culpabilidade, sujeitando o autor da ordem superior as penas imputadas ao delito praticado por seu subordinado, salvo se manifestamente ilegal. 

No caso o que se exclui é a culpabilidade e não a ilicitude, eis que esta está expressa no artigo 42 do Código Penal Militar, possuindo redação muito parecida com aquela prevista no artigo 23 do Código Penal Brasileiro. 

Desta forma, acaba se reconhecendo que praticar a conduta sob ordens superiores não exclui o caráter criminoso da ação, mas apenas a responsabilidade criminal, ao criar uma distinção com o estrito cumprimento do dever, que pode derivar de disposição legal expressa (ex. dever legal de socorro), sem a necessidade de ordem superior. 

Menoridade: 

O Código Penal Militar prevê a possibilidade de reconhecimento da responsabilidade criminal a partir dos 16 anos, desde que comprovado que o acusado possui a capacidade para reconhecer a ilicitude de suas ações (art. 50), que já façam parte do serviço militar ou estudem em instituições de ensino militares (idade mínima, 17 anos). 

Por outro lado, o artigo 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente considera penalmente inimputável todos aqueles que possuíam menos de 18 anos de idade na data do fato, havendo um potencial conflito de normas entre ambos os dispositivos, no que diz respeito à possibilidade de responsabilização pela prática de condutas ilícitas sujeitas ao Código Penal Militar, por adolescentes com mais de 16 anos de idade.

Dosimetria de pena:

Diferente da legislação penal comum, o Código Penal Militar considera como agravante a prática da conduta na posição de organizador, com coação à participação de outros, instigação de subordinado, ou que pratica o crime mediante recompensa (art. 53, parágrafo 2º). 

Outro ponto relevante é que a duração máxima da pena de reclusão é de 30 anos, fato que com a mudança trazida no Código Penal pelo Pacote Anticrime (art. 75, pena máxima de 40 anos), resultou em um tratamento diferenciado entre aqueles que praticam crimes sujeitos à jurisdição militar em face dos crimes comuns, ou seja, permitindo uma interpretação a respeito de maior leniência em relação aos crimes praticados por militares, ou numa tutela jurídica deficitária dos bens jurídicos tutelados pela parte especial do Código Penal Militar. 

Colocado de outra forma, um sujeito que pratica uma série de furtos (em concurso material) fora da competência da Justiça Militar está sujeito a um tempo máximo de pena superior ao sujeito que pratica estes mesmos delitos contra a administração militar, como no caso concreto que trataremos mais abaixo.

Reincidência: 

O Código Penal Militar, datado de 21/10/1969, é expresso no sentido que os crimes anistiados não podem ser considerados para efeito de reincidência

Nesta mesma direção, o artigo 64, inciso II, do Código Penal Brasileiro não permite que crimes militares próprios e políticos sejam considerados para efeito de reincidência (dispositivo com redação dada pela Lei 7.209/84). 

A análise de ambos os dispositivos deve ser vista à luz do momento histórico de cada legislação, ou seja, no intuito aparente de criar algum grau de proteção jurídica aos membros das Forças Armadas durante os anos em que o país esteve sob governo militar. 

Nesta mesma direção, reitera-se o tópico abordado acima com relação à excludente da culpabilidade, por cumprimento de ordem superior, ou da ilicitude, por cumprimento de dever legal.

Penas Acessórias: 

O Código Penal Militar trabalha com penas previstas diretamente em cada tipo penal e as chamadas acessórias, previstas em seu artigo 98

Trata-se de algo diferente da legislação penal comum, que trabalha apenas com as penas diretamente previstas no tipo penal ou com aquelas oriundas da conversão em penas restritivas de direitos. 

Estas penas acessórias guardam relação com a própria atividade do militar, como a perda de patente, a incompatibilidade com o oficialato, a exclusão das forças armadas, a suspensão do pátrio poder e a suspensão dos direitos políticos. 

Reabilitação: 

O Código Penal Militar permite a reabilitação criminal (exclusão dos apontamentos) desde que passado um prazo mínimo de 05 anos da extinção da pena (art. 134), possuindo similares requisitos com a legislação penal comum, com relação a tempo de residência no país, bom comportamento e ressarcimento do dano. 

No entanto, o Código Penal Brasileiro trabalha com prazo mínimo de 02 anos, conforme se observa em seu artigo 94. Além disso, o dispositivo penal militar traz restrições adicionais para a reabilitação, no que diz respeito a agentes reconhecidamente perigosos e no caso da pena acessória da perda do pátrio poder.

Prescrição: 

O Código Penal Militar possui uma sistemática específica para a aplicação da prescrição (art. 125)

Primeiramente, existem apenas dois marcos interruptivos da prescrição, quais sejam a instauração do processo e a sentença condenatória recorrível, ao tempo em que na legislação penal comum existe também a prolação de acórdão condenatório e o início do cumprimento de pena. 

Além disso, diferente da legislação penal comum, não existe disposição a respeito da suspensão do prazo prescricional durante a tramitação de recursos nos Tribunais Superiores (art. 116, III), o que permite o manuseio deste lapso legal no intuito de instrumentalização da via recursal, como forma de causar a extinção da punibilidade sem a necessidade do cumprimento da reprimenda aplicada. 

Por fim, considerando a existência de penas sem previsão na legislação penal comum é de se esperar o tratamento jurídico específico da prescrição na hipótese de sua aplicação. Neste caso, para penas de reforma ou suspensão do cargo, patente ou posto, o prazo prescricional é de 04 anos (art. 127). Cabe-se ressaltar que as penas acessórias são imprescritíveis (art. 130).

Os pontos acima mencionados são aqueles que considerei de maior relevância ao realizar uma análise comparada entre o Código Penal Militar e seu dispositivo equivalente na legislação comum

A realização de uma análise mais aprofundada certamente resultaria em mais elementos dignos de menção ou mesmo no aprofundamento de aspectos já mencionados. 

Exemplo prático: desaparecimento de metralhadoras das Forças Armadas em Barueri

Passando para a etapa final deste artigo, vou apresentar algumas considerações a respeito de recente caso concreto e midiático, envolvendo crime praticado por militares e sujeito às disposições do Código Penal Militar.

No dia 10 de outubro de 2023 foi constatado o desaparecimento de 21 metralhadoras de um quartel das Forças Armadas, na cidade de Barueri/SP. 

O crime previsto possui previsão no artigo 240 do Código Penal Militar com pena máxima de seis anos, para a forma simples, e dez anos para a forma qualificada. As qualificadoras são similares às previstas para o mesmo dispositivo no Código Penal Brasileiro (art. 155), quais sejam o rompimento de obstáculo, abuso de confiança, emprego de chave falsa, concurso de agentes e período noturno. 

Além disso, não se aplicam as atenuantes previstas nos parágrafos 1º e 2º deste dispositivo, eis que os bens subtraídos são de elevado valor, bem como o fato de não terem sido devolvidos, mas apenas encontrados (parcialmente). 

O delito em questão foi praticado contra a administração e dentro de estabelecimento militar, sendo possível a imputação do crime não apenas aos militares que estejam envolvidos, como também aos civis que tenham concorrido, como no caso de um delito “encomendado” em que o comprador dessas armas era certo, havendo prévio ajuste entre eles. 

No que diz respeito à possibilidade de imputação deste crime militar a civis, observa-se o disposto no artigo 9º, inciso III, alínea ´a´, combinado com o artigo 53, ambos do Código Penal Militar. 

No caso de imputação deste delito a civis, é importante se ressaltar que as regras para aplicação, cumprimento de pena e progressão de regime são aquelas previstas na legislação penal comum (artigo 62). 

No caso da imputação restar limitada à forma simples do crime de furto, a sanção corporal aplicada pode ter a sua aplicação suspensa por 02 a 06 anos, nos termos do artigo 84 do Código Penal Militar. 

Nesta mesma direção, é importante ressaltar que o delito em questão não pode ser objeto de benefícios como o Acordo de Não Persecução Penal e conversão de pena privativa de liberdade em penas restritivas de direitos, face à completa ausência de previsão legal no Código Penal Militar. 

Por sua vez, a transação penal e suspensão condicional do processo também não são aplicáveis ao caso, eis que o máximo de pena previsto no crime está além do teto previsto na Lei 9.099/95 para infrações penais de menor potencial ofensivo.

Por fim, considerando a gravidade da conduta e o poder destrutivo das armas subtraídas é esperada a responsabilização não apenas com base nas penas previstas no tipo penal, como também na aplicação de uma ou mais penas acessórias previstas no artigo 98 do Código Penal Militar

Além disso, inexiste a possibilidade de aplicação de pena diversas como morte, impedimento, ou reforma, eis que ausente previsão legal e presente vedação constitucional, quanto à pena de morte por crime praticado em tempo de paz (art. 5º, inciso XLVII, alínea ´a´).

Conclusão

No artigo de hoje, realizei uma rápida análise dos principais dispositivos da parte geral do Código Penal Militar Brasileiro, apresentando uma comparação com a legislação penal comum e, ao fim, abordando o recente caso midiático de crime militar, buscando a conjugação dos conceitos analisados com a realidade concreta.

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Advogado (OAB/SP 318.248). Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Pós-graduado em Direito Penal Econômico pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim). Pós-graduado em Direito...

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