Os princípios do direito tributário são regras importantes que guiam os juízes e advogados no campo do Direito. Entre eles estão: Princípio da Legalidade, Princípio da Isonomia, Princípio da Irretroatividade, Princípio da Anterioridade, Princípio do Não-Confisco, Capacidade Contributiva e Liberdade de Tráfego.
O Direito Tributário é uma área fundamental do ordenamento jurídico que disciplina a arrecadação de tributos/impostos pelo Estado e a relação entre o Fisco e os contribuintes.
Seja você um empreendedor, um profissional liberal ou apenas um cidadão, o Direito Tributário faz parte do seu dia a dia.
Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação – IBPT, você trabalhou 149 dias de 2025 apenas para pagar imposto. Mas, para garantir que essa relação seja equilibrada, justa e previsível, o Direito Tributário pauta-se em princípios que orientam a criação, interpretação e aplicação das normas tributárias.
Continue a leitura para saber mais sobre cada um deles! 😉
O que é o Direito Tributário?
Um pouco já foi introduzido acima: o Direito Tributário é o ramo do Direito Público que regula a arrecadação de tributos, suas espécies, competências e limites, bem como os direitos e deveres dos contribuintes e do Estado.
Ele busca garantir que a cobrança de impostos seja feita de forma legal, justa e eficiente, assegurando recursos para o Estado sem desrespeitar direitos individuais.
O Direito Tributário estuda as normas e princípios que regulam a atividade do Estado de instituir, cobrar e fiscalizar tributos. Em outras palavras, é o conjunto de regras que estabelece quem paga, o que se paga e como se paga os tributos.
Sua principal fonte é a Constituição Federal, que garante a proteção dos direitos do contribuinte frente ao poder de tributar do Estado.
A CF-88 trata do tema de maneira específica a partir de seu artigo 145. Mas os princípios propriamente ditos se iniciam no artigo 150, em Seção denominada “Das Limitações do Poder de Tributar”.
Por se tratar de um instrumento de poder estatal, é essencial que a atuação tributária seja limitada por normas claras e princípios jurídicos fundamentais, esses são os princípios do Direito Tributário.
Antes de se passar à discussão dos princípios de maneira individualizada, convém trazer conceitos doutrinários sobre o Direito Tributário e o tributo propriamente dito:
O Direito Tributário é o conjunto de normas jurídicas que disciplina a atividade de tributação, levada a efeito pelo Estado e pelas entidades a ele relacionadas, de forma a que na cobrança de tributos e de penalidades pecuniárias decorrentes da infração a deveres tributários se observem critérios e limites pré-estabelecidos. Essa definição somente estará completa quando se definir o que se entende tributo.” (SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Manual de direito tributário / Hugo de Brito Machado Segundo. – 15. ed., rev., atual. e atual. – Barueri [SP] : Atlas, 2025, p. 20)
E continua Hugo de Brito Machado Segundo, explicitando o conceito de tributo para o direito brasileiro:
No Direito Brasileiro, a definição de tributo consta do já mencionado art. 3º do CTN, segundo o qual tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.” (idem, p. 27)
No mesmo sentido, Regina Helena Costa:
O conceito de Direito Tributário como o conjunto de normas jurídicas que disciplinam a instituição, a arrecadação e a fiscalização de tributos.” (COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional / Regina Helena Costa. – 15. ed. – São Paulo: SaraivaJur, 2025. p. 10).
E, sobre tributo, para que o conceito fique bastante esclarecido, para passarmos:
O conceito de tributo é extraído da própria Constituição. Da leitura do capítulo dedicado à disciplina do Sistema Tributário Nacional (arts. 145 a 156), depreende-se a noção essencial desse conceito, segundo a qual tributo corresponde a uma relação jurídica existente entre Estado e contribuinte, uma vez implementada determinada situação fática prevista em lei como autorizadora dessa exigência, cujo objeto consiste numa prestação pecuniária, não revestida de caráter sancionatório, e disciplinada por regime jurídico próprio.
Importância dos princípios do Direito Tributário:
Os princípios tributários são normas basilares que orientam todo o sistema fiscal. Eles funcionam como uma espécie de “super regra” e servem como limites ao poder de tributar e garantem proteção ao contribuinte contra abusos.
Mais do que simples orientações, os princípios possuem força normativa e são utilizados como critérios de interpretação das leis e de controle da constitucionalidade dos tributos.
Sem esses princípios, o Estado poderia agir arbitrariamente, comprometendo direitos individuais e a segurança jurídica. Por isso, conhecer os principais princípios do Direito Tributário é essencial tanto para operadores do Direito quanto para os próprios contribuintes, sejam pessoas físicas ou jurídicas.
O Código Tributário Nacional também dispõe a respeito, de forma clara:
Art. 6º A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei
O saudoso Paulo de Barros Carvalho assim lecionava sobre os limites objetivos no direito tributário:
Os “limites objetivos” distinguem-se dos valores, pois são concebidos para atingir certas metas, certos fins. Estes, sim, assumem o porte de valores. Aqueles limites não são valores, são procedimentos, se os considerarmos em si mesmos, mas voltam-se para realizar valores, de forma indireta, mediata, que são os fins para os quais são preordenados os procedimentos. Os princípios de direito tributário, por seu turno, geralmente se expressam como “limites objetivos”, posto como sobre-regras que visam a implementar os valores estipulados no ordenamento jurídico.” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: linguagem e método.8 ed. São Paulo: Noeses, 2021, p. 305)
Para fechar sobre a importância destes princípios, Paulo de Barros Carvalho complementa, já adiantando o que há por vir logo adiante:
Não há como negar que os cânones da legalidade, da anterioridade e da irretroatividade trazem consigo uma carga axiológica expressiva, na medida em que representam conquistas seculares mantidas e anunciadas pela tradição do nosso direito.“ (idem, p. 305)
Quais são os 7 princípios do Direito Tributário?
A seguir vamos falar dos sete princípios mais importantes do Direito Tributário, que estão presentes na Constituição Federal e na doutrina, já destacando, primeiramente, aqueles considerados como verdadeiros cânones por Paulo de Barros Carvalho.
1. Princípio da Legalidade (tributária)
Este princípio estabelece que nenhum tributo pode ser criado ou majorado sem que isso esteja previamente previsto em lei. Ou seja, o Poder Público só pode cobrar tributos que tenham previsão legal expressa, assegurando a proteção do contribuinte contra arbitrariedades. Este é o pilar do direito tributário!
O princípio da legalidade propriamente dito está estabelecido no art. 5º, II, da Constituição:
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
Na esfera tributária, esse conceito ganha outra roupagem, que pode ser traduzida, de forma análoga como ninguém será obrigado a pagar tributo senão em virtude de lei.
O artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, estabelece o princípio da legalidade de forma expressa:
150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
Ou seja, somente o Poder Legislativo, por meio de lei formal, pode instituir obrigações tributárias. Em sua essência, ele diz que nenhum tributo pode ser criado ou aumentado sem que haja uma lei que o preveja.
Isso garante que o contribuinte não seja surpreendido com a cobrança de um tributo que não tenha sido previamente estabelecido por uma lei votada pelo poder legislativo.
Veja-se um exemplo de interpretação do princípio pelo Supremo Tribunal Federal:
EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral. Direito Tributário. Princípio da legalidade tributária. Necessidade de análise de cada espécie tributária e de cada caso concreto. Contribuição ao PIS/PASEP e à Cofins. Parágrafo 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04. Possibilidade de o Poder Executivo reduzir e restabelecer alíquotas da contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não-cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar. Presença de função extrafiscal a ser desenvolvida. Não cumulatividade. Revogação de norma que concedia direito a apuração de crédito. Possibilidade. 1. A observância do princípio da legalidade tributária é verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz de cada caso concreto, sendo certo que não existe ampla e irrestrita liberdade para o legislador realizar diálogo com o regulamento no tocante aos aspectos da regra matriz de incidência tributária. 2. Para que a lei autorize o Poder Executivo a reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, é imprescindível que o valor máximo dessas exações e as condições a serem observadas sejam prescritos em lei em sentido estrito, bem como exista em tais tributos função extrafiscal a ser desenvolvida pelo regulamento autorizado. 3. Na espécie, o § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04 permite ao Poder Executivo reduzir e restabelecer, até os percentuais legalmente fixados, as alíquotas da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não cumulatividade dessas contribuições, nas hipóteses que fixar. Além da fixação de tetos, houve, na lei, o estabelecimento das condições para que o Poder Executivo possa alterar essas alíquotas. Ademais, a medida em tela está intimamente conectada à otimização da função extrafiscal presente nas exações em questão. Verifica-se, ainda, que o diálogo entre a lei tributária e o regulamento se dá em termos de subordinação, desenvolvimento e complementariedade. 4. É constitucional a Lei nº 10.865/04 na parte em que, ao dar nova redação ao inciso V do art. 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03, revogou as normas legais que davam ao contribuinte direito de apurar, no âmbito do sistema não cumulativo de cobrança das referidas contribuições, créditos em relação a despesas financeiras decorrente de empréstimos e financiamentos. A alteração vale para todos aqueles que estão submetidos à sistemática não cumulativa de cobrança da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins. Ademais, tal mudança não desnatura o próprio modelo não cumulativo dessas contribuições. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. 6. Tese proposta para o Tema 939 da sistemática de repercussão geral: “É constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”.
leia mais
(RE 1043313, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 10-12-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-057 DIVULG 24-03-2021 PUBLIC 25-03-2021)
2. Princípio da Anterioridade
Este princípio impede a cobrança de tributo no mesmo exercício financeiro da publicação da lei que o instituiu ou aumentou, conforme art. 150, III, b, da Constituição:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III – cobrar tributos:
(…)
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;
Veja-se o contexto histórico traçado por Hugo de Brito Machado Segundo:
Verificou-se, porém, que mesmo em face da limitação tal como prevista na CF/88, em seu texto originário, o Poder Público vinha adotando práticas que terminavam neutralizando a segurança jurídica trazida pela garantia da anterioridade. Criava ou aumentava tributos através de leis impressas no Diário Oficial do dia 31 de dezembro. E, logo em seguida, no dia 2 de janeiro do ano seguinte, atendida a exigência da anterioridade da lei (“publicada” no exercício anterior), o tributo já passava a ser cobrado. Embora a efetiva circulação do Diário Oficial – que era apenas impresso, em uma época em que não havia internet – só ocorresse no dia 2 de janeiro, a jurisprudência terminou por entender que, estando o jornal formalmente posto à venda nas últimas horas do dia 31/12, ainda que apenas no prédio da imprensa oficial em Brasília, o princípio da anterioridade estaria respeitado.
Tais abusos fizeram com que fosse inserida na Constituição, com a EC nº 42/2003, uma exigência adicional relacionada à anterioridade. Além de o tributo somente poder ser exigido a partir do exercício seguinte ao da publicação da lei, essa cobrança não pode ocorrer antes de decorridos 90 dias da data em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou. São dois prazos que devem ser cumpridos paralela e cumulativamente: a espera pelo exercício seguinte e o transcurso de 90 dias (CF/88, art. 150, III, c). (idem, p. 57)
O objetivo é garantir previsibilidade, permitindo que o contribuinte se organize financeiramente antes de ser onerado. Regina Helena Costa assim o define:
Consoante o art. 150, III, b, CR, é vedado às pessoas políticas exigir tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou. Visa o preceito evitar seja o contribuinte surpreendido mediante uma nova imposição fiscal ou a majoração de tributo já existente. Essa modalidade de anterioridade é denominada genérica, porquanto aplicável aos tributos em geral, ou ao exercício, uma vez que atrelada à noção de exercício financeiro.” (idem, p. 68)
Existe ainda a anterioridade nonagesimal (art. 150, III, “c”), que exige um prazo mínimo de 90 dias entre a publicação da lei e o início da cobrança. Ainda sob os ensinamentos de Regina Helena Costa:
Essa nova anterioridade, a par de sua especificidade, uma vez que pertinente apenas às contribuições sociais destinadas ao financiamento da seguridade social, distingue-se, ainda, da anterioridade genérica, a nosso ver, em dois aspectos: 1) não se atrela a exercício financeiro, mas consigna prazo para que o contribuinte acostume-se e organize-se para fazer face à nova exigência fiscal; e 2) protege o contribuinte não apenas da instituição ou aumento de contribuição social para o financiamento da seguridade social, mas também de qualquer modificação no regime desse tributo que possa ser considerada onerosa ao contribuinte.
Inspirada na experiência positiva de assegurar-se período certo de tempo para evitar a surpresa, diante da imposição de maior ônus aos contribuintes de contribuições sociais para o financiamento da seguridade social, a EC n. 42/2003, acrescentou a alínea c ao inciso III do art. 150, prescrevendo ser vedado às pessoas políticas cobrar tributos “antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b”.
Desse modo, criou-se mais uma limitação à instituição ou aumento de tributos, porquanto se assegura ao contribuinte o prazo mínimo de noventa dias para que se acostume com a nova exigência, em homenagem, uma vez mais, aos princípios da segurança jurídica e da não surpresa.” (idem, p. 68)
Veja-se o que o STF definiu como tese no julgamento do Tema 1.283 de Repercussão Geral, para deixar claro que a anterioridade também se aplica a majoração de tributo pré-existente, ainda que de forma indireta:
O princípio da anterioridade tributária, geral e nonagesimal, se aplica às hipóteses de redução ou de supressão de benefícios ou de incentivos fiscais que resultem em majoração indireta de tributos, observadas as determinações e as exceções constitucionais para cada tributo.
(RE 1473645 RG, Relator(a): MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 21-03-2025, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-136 DIVULG 28-04-2025 PUBLIC 29-04-2025)
3. Princípio da Irretroatividade
Conforme o artigo 150, inciso III, alínea “a”, da Constituição, a lei tributária não pode retroagir para atingir fatos geradores ocorridos antes de sua vigência:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(…)
III – cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
Assim, uma nova lei que aumenta tributos ou cria obrigações só pode ser aplicada para fatos geradores ocorridos após sua vigência, garantindo segurança e previsibilidade.
Este princípio proíbe a cobrança de tributos sobre fatos geradores que ocorreram antes da vigência da lei que os criou ou aumentou. Se uma nova lei aumentar o valor do Imposto de Renda, por exemplo, ela só poderá ser aplicada para o ano seguinte.
O objetivo, mais uma vez, é garantir a previsibilidade e a segurança jurídica.
Hugo de Brito Machado Segundo não deixa dúvidas:
Diversamente da anterioridade e da estrita legalidade, a vedação à retroatividade das leis não comporta qualquer exceção relativamente à instituição ou ao aumento de tributos. Não existem situações excepcionais nas quais seja possível exigir tributo em relação a um fato ocorrido antes de iniciar-se a vigência da lei correspondente. Entretanto, como se trata de proteção do cidadão contribuinte em face do Estado, a limitação de que se cuida não impede o poder público de editar normas de efeitos retroativos em benefício do contribuinte (p. ex., anistia, redução de penalidades etc.). Essa ideia resta hoje cristalizada na Súmula 654 do STF (“A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art. 5º, XXXVI, da Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado”), que se originou do entendimento segundo o qual “o princípio da irretroatividade da lei tributária deve ser visto e interpretado, desse modo, como garantia constitucional instituída em favor dos sujeitos passivos da atividade estatal no campo da tributação. Trata-se, na realidade, à semelhança dos demais postulados inscritos no art. 150 da Carta Política, de princípio que – por traduzir limitação ao poder de tributar – é tão somente oponível pelo contribuinte à ação do Estado”. (idem, p. 52)
Paulo de Barros Carvalho trata, ainda, da retroatividade das leis interpretativas, ensinando que há ocasiões em que se concede ao legislador a possibilidade de atribuir às leis sentido retroativo. Isso é exposto no art. 106, do Código Tributário Nacional. Mas apresenta-se, para contextualização, também, o art. 105:
Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aquêles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos têrmos do artigo 116.
Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;
II – tratando-se de ato não definitivamente julgado:
a) quando deixe de defini-lo como infração;
b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo;
c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática.
Mas merece cautela a análise das leis ditas interpretativas, que devem ser diferenciadas de leis inovadoras. Paulo de Barros Carvalho finaliza:
Lei que interpreta outra há de ser retroativa apenas se destinada a eliminar as obscuridades e ambiguidades. Não se admite, contudo, que lei falsamente interpretativa retroaja, atingindo situações consolidadas.” (idem, p. 319)
4. Princípio da Isonomia
Também chamado de princípio da igualdade tributária, visa a evitar discriminações injustificadas na aplicação de tributos e determina que todos os contribuintes que se encontram em situação equivalente devem ser tratados de forma igual.
Está previsto no artigo 150, inciso II, da Constituição:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(…)
II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
Mais uma vez, esse princípio tributário encontra referência no festejado art. 5º, em seu próprio caput:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade…
Isso não impede tratamentos diferenciados, desde que haja justificativa legítima, como a proteção de setores vulneráveis ou estímulo a determinadas atividades econômicas.
Aqui, lembra-se do conceito filosófico aristotélico primordial para aplicação da própria Justiça: Tratar os iguais de forma igual; tratar os desiguais de forma desigual. Ou dar a cada um o que é devido. No presente caso, cobrar (ou isentar), de cada um, o que é devido.
5. Princípio da Capacidade Contributiva
Previsto no artigo 145, §1º, da Constituição, esse princípio estabelece que os tributos devem ser graduados conforme a capacidade econômica do contribuinte. Em outras palavras, quem tem mais recursos deve pagar proporcionalmente mais (não, esse texto não pretende adentrar na polêmica da taxação das grandes fortunas, apesar de estar disposto na CF/88).
Veja-se o que diz a Constituição sobre o Princípio da Capacidade Contributiva:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(…)
§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Esse princípio busca uma tributação justa e solidária, em conformidade com os ideais de justiça fiscal e redistribuição de renda. Mais uma vez, o conceito filosófico aristotélico primordial para aplicação da própria Justiça: dar a cada um o que é devido.
6. Princípio do Não-Confisco
O artigo 150, IV, de forma expressa, veda o uso de tributos com efeito de confisco:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(…)
IV – utilizar tributo com efeito de confisco;
Isso significa que o tributo não pode ser tão elevado a ponto de inviabilizar a atividade do contribuinte ou retirar-lhe patrimônio em medida desproporcional. O tributo deve ser instrumento de arrecadação, e não de punição.
Diz-se que confiscar significa, como esclarece Humberto Ávila:
aniquilar a eficácia mínima dos princípios da proteção da propriedade e da liberdade em favor da tributação”. (ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 19.).
Portanto, o princípio do não-confisco proíbe que o tributo seja utilizado para expropriar bens do contribuinte. Ou seja, a carga tributária não pode ser tão elevada a ponto de impossibilitar o exercício regular da atividade econômica ou resultar na perda da propriedade.
7. Princípio da Liberdade de Tráfego
Conforme o artigo 150, inciso V, da Constituição, é proibido estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens entre os Estados e Municípios:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(…)
V – estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;
Ou seja, o princípio da liberdade de tráfego assegura o livre comércio interno e a integração do mercado nacional, sem barreiras tributárias entre entes federativos.
Mais uma vez, o art. 5º serve de inspiração:
XV – é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;
Este princípio garante que o Estado não pode restringir o tráfego de pessoas e bens por meio da cobrança de tributos intermunicipais ou interestaduais. A livre circulação de pessoas e bens é um pilar da nossa economia, e os tributos não podem ser usados como barreiras para esse movimento.
Exemplos práticos de aplicação dos princípios:
Para entender na prática a aplicabilidade de cada princípio, trouxe alguns exemplos. Confira!
Princípio da Legalidade
Se uma prefeitura decide criar uma (nova) taxa de lixo, ela só poderá cobrá-la após a aprovação de uma lei municipal que a institua.
Princípio da Anterioridade
Um aumento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) só pode ser cobrado no ano seguinte ao da publicação da lei, respeitando também o prazo de 90 dias (anterioridade nonagesimal).
Princípio da Irretroatividade
Se uma lei que aumenta ICMS entra em vigor em 2025, não pode ser aplicada a uma compra feita em 2024.
Princípio da Isonomia
Para aplicação deste princípio, dois contribuintes com a mesma renda devem pagar o mesmo percentual de imposto.
Princípio da Capacidade Contributiva
O Imposto de Renda é, talvez, o melhor exemplo da aplicação deste princípio no Brasil, pois suas alíquotas aumentam conforme a faixa de renda do contribuinte, de forma progressiva.
Princípio do Não-Confisco
A cobrança de tributos não pode inviabilizar a continuidade de uma empresa, por exemplo.
Um exemplo jurisprudencial prático e resumido: o STF definiu, sob o Tema nº 863 de Repercussão Geral, os limites da multa fiscal qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio, tendo em vista a vedação constitucional ao efeito confiscatório, de modo que instituiu a tese de que a multa tributária qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio limita-se a 100% do débito tributário, podendo ser de até 150% do débito tributário caso se verifique a reincidência, até que seja editada lei complementar federal sobre a matéria.
Princípio da Liberdade de Tráfego
Estados não podem criar taxas que impeçam a circulação de produtos entre eles.
Quais os desafios na aplicação dos princípios do Direito Tributário?
Apesar da importância dos princípios, sua aplicação não é simples. A complexidade do sistema tributário brasileiro, a divergência interpretativa entre juristas e a necessidade de equilibrar arrecadação com justiça fiscal são desafios constantes.
Além disso, conflitos entre princípios às vezes precisam ser resolvidos, exigindo habilidade para ponderação e estratégia de atuação.
Outro desafio (aparentemente sempre atual) é garantir o cumprimento do princípio da capacidade contributiva em face da alta carga tributária regressiva em certos impostos, que onera desproporcionalmente os mais pobres. A luta por simplificação, transparência e eficiência tributária também é contínua.
Apesar da importância e da previsão constitucional dos princípios, sua aplicação na prática enfrenta diversos desafios, notadamente a complexidade da legislação, a divergência de interpretação e a própria falta de atualização legislativa.
Nesse ponto, o Poder Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF), tem um papel fundamental na interpretação e aplicação desses princípios, garantindo que o contribuinte não seja prejudicado.
Conclusão
Os princípios do Direito Tributário funcionam como pilares que garantem justiça, segurança e equilíbrio na relação entre Estado e cidadãos na matéria tributária, sendo capazes de fundamentar a promoção e defesa de um sistema mais justo e efetivo para todos.
Esses princípios, com destaque à Legalidade, Anterioridade e Irretroatividade, são mais do que meros ideais, são garantias constitucionais, com clara inspiração no art. 5º da Constituição, que protegem o contribuinte e asseguram um sistema tributário mais justo, seguro e equilibrado.
Conhecer e exigir a aplicação desses princípios é fundamental para a cidadania fiscal e para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito.
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Ficou com alguma dúvida sobre os princípios do direito tributário? Tem algum que você também acha importante? Compartilhe com a gente nos comentários abaixo! 😉
Conheça as referências deste artigo
ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. RE 736090, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 03-10-2024, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-s/n DIVULG 28-11-2024 PUBLIC 29-11-2024
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. RE 1043313, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 10-12-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-057 DIVULG 24-03-2021 PUBLIC 25-03-2021
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. RE 1473645 RG, Relator(a): MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 21-03-2025, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-136 DIVULG 28-04-2025 PUBLIC 29-04-2025
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: linguagem e método.8 ed. São Paulo: Noeses, 2021.
COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional / Regina Helena Costa. – 15. ed. – São Paulo: SaraivaJur, 2025.
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Manual de direito tributário / Hugo de Brito Machado Segundo. – 15. ed., rev., atual. e atual. – Barueri [SP] : Atlas, 2025
Advogado (OAB/DF 46.245) com atuação em direito empresarial, tributário, societário e em contencioso estratégico. Pós-graduado em direito empresarial pela FGV. Graduado pelo Centro Universitário IESB/DF. Membro da comissão de Direito Empresarial da OAB/DF....
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Muito boa explicação. Mais clara que dessa forma, impossível. Muito obrigado
Olá, que bom que gostou do conteúdo, Lucas! Nós sempre compartilhamos as novidades do Portal na nossa newsletter. Você já assina? Se ainda não, basta acessar e digitar seu nome e email: http://materiais.aurum.com.br/assinar-newsletter
Espero te ver por lá 🙂
Abraços!
Bem autoexplicativo! Pude acompanhar tranquilamente.
Eu sempre estudar por esta coluna ou blog, os conteúdos são ótimos e bem explicados.
É bem complexo, tenho muito que aprender ainda, pra mim é tudo novo, nunca tinha me interessado pelo assunto, gostei bastante da explicação, parabéns pelo trabalho dos professores.
Gostei muito dos princípio do Direito tributário foi ótimo explicado .