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Confira o que você precisa saber sobre o Direito dos Refugiados

Confira o que você precisa saber sobre o Direito dos Refugiados

13 out 2023
Artigo atualizado 30 out 2023
13 out 2023
ìcone Relógio Artigo atualizado 30 out 2023
O Direito dos Refugiados visa garantir proteção às pessoas que estão fora de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição relacionados a questões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social ou opinião política, como também devido à grave violação de direitos humanos e conflitos armados.

Em um mundo marcado por conflitos, instabilidade política e perseguições a determinados grupos, milhares de indivíduos cotidianamente se veem forçados a abandonar suas terras natais em busca de um local seguro para sobreviverem. No entanto, essa busca por segurança e proteção é permeada por uma série de obstáculos, incertezas e dilemas. 

Sob esta ótica, o direito ao refúgio se materializa no ato pelo qual um Estado concede proteção a indivíduos que correm risco em outro país, por motivo de guerra ou por perseguições de caráter racial, religioso, nacionalidade ou pertinência a determinado grupo social. Sendo um tema de extrema relevância para sociedade internacional e de grande complexidade por envolver diversos assuntos.

A matéria é hoje objeto de atenção do Direito Internacional dos Refugiados, ramo do Direito Internacional Público e do Direito Internacional dos Direitos Humanos, e visa fundamentalmente a regular a proteção de pessoas nessa situação e a estabelecer o marco legal da cooperação internacional em matéria de refúgio.

Neste contexto, o texto busca fornecer uma visão abrangente do tema, abordando sua origem, a atual proteção internacional oferecida, o panorama legal brasileiro e as distinções fundamentais com o asilo político, instituto de natureza semelhante. 

Por isso, continue a leitura para entender mais sobre o direito dos refugiados! 😉 

Qual a origem do Direito dos Refugiados?

A palavra “refúgio” evoca a ideia de um local seguro para onde alguém busca proteção. Embora seja um tema altamente relevante nos dias atuais, não é um fenômeno recente. Ao longo da história, diversas questões de natureza econômica, política, social e religiosa desencadearam conflitos e perseguições, resultando no deslocamento forçado de milhões de pessoas.

Os fundamentos do que hoje entendemos como direito dos refugiados têm raízes profundas no século XX. Isso se deve, em grande parte, à devastação e à perseguição contra determinados grupos durante as duas grandes guerras mundiais que ocorreram entre 1914 e 1918, e 1939 e 1945, respectivamente, bem como à criação da Organização das Nações Unidas em 1945. 

O artigo 14, disposto na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), afirma: 

Toda pessoa tem o direito de buscar asilo em outros países se for perseguida”.

Conscientes da ausência de regulamentação específica protetora para esses indivíduos e preocupados com os potenciais impactos adversos decorrentes dos deslocamentos em seus territórios, os Estados uniram-se por meio da comunidade internacional para enfrentar esse desafio.

Assim, em 1950, foi fundado o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), uma agência da ONU dedicada à proteção das pessoas em situação de refúgio. Em 28 de julho de 1951, foi estabelecida a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados, que entrou em vigor em 1954 e é considerada a Carta Magna do Instituto.

Apesar de sua importância universal, a Convenção definiu o conceito de refugiado de forma limitada no tempo e no espaço, reconhecendo apenas aqueles que fugiram de eventos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951. Essa limitação tornaria a Convenção ineficaz com o passar do tempo. 

Conscientes dessa limitação, a ONU estabeleceu em 31 de janeiro de 1967 o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, com o objetivo de ampliar a definição de refugiado. Esse Protocolo eliminou as restrições temporais e geográficas da Convenção, permitindo que cada Estado-Parte formulasse ou não reservas, sendo um documento independente da Convenção. 

Qual a proteção internacional oferecida aos refugiados?

A partir desse momento, os principais instrumentos jurídicos do Direito Internacional dos Refugiados estavam estabelecidos, nomeadamente a mencionada Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, de 1951, e sua subsequente atualização pelo Protocolo de 1967. Ambos são conhecidos hoje como o “Estatuto dos Refugiados”. 

O Direito Internacional dos Refugiados é orientado pelo princípio do non-refoulement, também conhecido como princípio da “proibição de expulsão ou de rechaço”, que impede o retorno de refugiados ao Estado de origem, onde enfrentam perseguição. 

Este princípio é consagrado no artigo 33 da Convenção: 

Art. 33 – Proibição de expulsão ou de rechaço
1.  Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de maneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas opiniões políticas.  (…)

Entretanto, é importante notar que a própria Convenção prevê que um potencial refugiado pode ser rejeitado pelo Estado de refúgio em casos em que seja considerado uma ameaça séria à segurança do país anfitrião ou tenha sido condenado definitivamente por um crime particularmente grave que represente uma ameaça à comunidade do referido país. 

Das contribuições de Guido Soares extraímos os direitos e obrigações sumarizados, em 1953, pelo primeiro Alto Comissário da ONU para os Refugiados, Gerrit Jan Van Heuven Goedhar:

  1. Igualdade de tratamento entre os refugiados e os nacionais do Estado de refúgio: liberdade religiosa (art. 4); livre acesso aos tribunais (art. 16, par. 1º); direito à educação primária (art. 22); direito à assistência médica e social, com especial atenção para os refugiados em estado de indigência (art. 23); direito ao trabalho, a condições laborais dignas e à seguridade social (art. 24); e inexistência de imunidade tributária (art. 24).
  2. Igualdade de tratamento entre os refugiados e outros nacionais de seu Estado que também se encontram no Estado de refúgio: reconhecimento dos direitos autorais e de propriedade industrial (art. 14); direito à assistência judiciária; e isenção de caitio judicatum solvi (art. 16, par. 2º)
  3. Tratamento mais favorável do que o conferido a outros estrangeiros que não são refugiados; direito de associação; liberdade sindical (art. 15); e direitos associados ao exercício de atividades profissionais assalariadas (art. 17, par. 1º)
  4. Tratamento tão favorável quanto possível e, em todo caso, não menos favorável do que aquele conferido, nas mesmas circunstâncias, a estrangeiros em geral: direito ao exercício de atividades não assalariadas (art. 18) e de profissões liberais (art. 19); direito de aquisição de bens móveis e imóveis (art. 13); e direito ao ensino em todos os níveis e ao reconhecimento de títulos acadêmicos (art. 22, par. 2º).

É importante observar que a condição de refugiado é perdida em algumas situações, como quando a pessoa volta a receber a proteção do país do qual é nacional, adquire uma nova nacionalidade e passa a ser protegida pelo novo Estado, volta voluntariamente para o país que deixou ou cessa a perseguição das quais era vítima. Essas condições estão dispostas no artigo 1º, item C, da Convenção. 

Acordos regionais de direitos dos refugiados

Além dos instrumentos globais sobre o tema, existem também acordos regionais, como a Convenção de 1969 da Organização de Unidade Africana (UOA), que aborda questões específicas dos refugiados na África, e a Declaração de Cartagena, de 1984, que ampliou a definição de refugiado e influenciou as legislações nacionais sobre refúgio nas Américas.

A expansão da proteção aos refugiados teve um impacto significativo nas políticas de acolhimento de migrantes e refugiados em várias nações. Um exemplo notável ocorreu nos Estados Unidos, quando, em 1978, uma emenda ao Immigration and Nationality Act eliminou as disparidades nas cotas de imigração entre os hemisférios ocidental e oriental, permitindo a concessão de vistos de residência para refugiados. 

Mais recentemente, em 2016, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Declaração de Nova York, que estabeleceu medidas entre as nações para forjar um “pacto global sobre refugiados”. Estas ações englobam o suporte aos países que recebem refugiados e o auxílio aos países de origem para garantir o retorno dos refugiados de maneira segura e digna. 

Quais são os Direitos dos Refugiados no Brasil?

O compromisso do Brasil com a acolhida dos refugiados em seu território é respaldado por tratados e leis específicas. O país ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre Refugiados de 1951, juntamente com o Protocolo de 1967, demonstrando seu comprometimento com os direitos dos refugiados. Além disso, o Brasil promulgou a Lei. 9.474, datada de 22 de julho de 1997, que regula a matéria. 

A Lei nacional estabelece mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951 e define os critérios para o reconhecimento do status de refugiado, bem como os procedimentos para a concessão da proteção a essas pessoas. Entretanto, é importante observar que, apesar de ter sido promulgada há algum tempo, essa legislação ainda é pouco conhecida no Brasil, o que pode prejudicar a sua efetiva aplicação. 

O processo de pedido de refúgio no Brasil é conduzido por quatro organismos: o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), o Departamento da Polícia Federal, as Cáritas Arquidiocesanas (responsáveis pelo acolhimento humanitário dos refugiados) e o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE). Esse processo envolve quatro fases distintas: 

  1. Solicitação de refúgio por meio da Polícia Federal nas fronteiras;
  2. Análise do pedido realizada pelas Cáritas Arquidiocesanas; 
  3. Decisão proferida pelo Comitê Nacional para Refugiados;
  4. Recurso cabível da decisão negativa do CONARE para o Ministro da Justiça, que decidirá, em último grau de recurso.

A quarta fase somente ocorre se o refugiado não conseguir o benefício na terceira fase. Caso seja concedido o refúgio, o indivíduo também recebe um passaporte do país que concedeu o benefício, conhecido como Passaporte Nansen, em homenagem a Fridtjof Nansen, o primeiro Alto Comissário da Liga das Nações para Refugiados, laureado com o Prêmio Nobel da Paz em 1922. 

A lei nacional visa garantir uma proteção abrangente para as pessoas que buscam refúgio no país, inclusive àqueles cujos pedidos não foram negados, impedindo a deportação para seus países de origem enquanto persistirem as circunstâncias de risco à vida, integridade física e liberdade. 

O Brasil tem se destacado por seus esforços na promoção e proteção dos direitos dos refugiados, e sua legislação nesse âmbito vem sendo reconhecida pela ACNUR como um paradigma de legislação uniforme na América do Sul.  

Leia também: Entenda o que é asilo político e como ele funciona no Brasil

Quais as diferenças entre direitos dos refugiados e asilo político?

Apesar de ambos resguardarem, em sua essência, a proteção da pessoa humana, o direito de refúgio não se confunde com o direito de asilo. Dentre as principais diferenças, podemos citar que: enquanto o refúgio é fundamentado normalmente em uma perseguição a um grupo de indivíduos, em razão de sua raça, nacionalidade ou opção política, o asilo decorre da perseguição ao indivíduo.

Além disso, o refúgio possui diretrizes globais elaboradas pela Organização das Nações Unidas (ONU), por meio do Alto Comissariados das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), e tem como seu principal instrumento jurídico a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, de 1951, atualizada pelo Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, de 1967, já o asilo é disciplinado por tratados internacionais de cunho regional. 

Para facilitar a compreensão e assimilação das diferenças mais marcantes entre esses dois importantes institutos de Direito Internacional, valemo-nos da tabela abaixo:

ASILOREFÚGIO

Ato discricionário e soberano do Estado

Concessão é dever do Estado 

Não existe foro internacional específico para o tratamento de asilo.

Controle pertence a órgãos internacionais, como o ACNUR

Motivos para concessão são políticos
Pode ser fundamentado em perseguições por motivo de raça, grupo social, religião e penúria.

Perseguição individualizada
Perseguição atinge a um número elevado de pessoas, mais generalizado
Nem sempre regulado por tratadosRegulado por Tratados
Não existe foro internacional competente para o tema ou está sujeito a qualquer órgão internacional.O tema é tratado no âmbito internacional pelo ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados

A proteção pode se dar no território do país estrangeiro (asilo territorial) ou na embaixada do país de destino (asilo diplomático)


Em regra, a proteção se opera fora do país
ConstitutivoDeclaratório

Conclusão

No texto, exploramos os aspectos fundamentais do direito dos refugiados, desde sua origem histórica até as nuances das proteções oferecidas em níveis internacional e nacional. Também destacamos as diferenças cruciais entre os direitos dos refugiados e o asilo político.

Ao examinar a Origem dos Direitos dos Refugiados, aprendemos que, em especial, a Segunda Guerra Mundial e a formação da Organização das Nações Unidas (ONU) desempenharam um papel crucial no estabelecimento das bases para a proteção dos refugiados a partir do século XX. 

Exploramos a Proteção Internacional aos Refugiados, destacando o papel do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) na defesa dos direitos dos refugiados em todo o mundo e a Convenção de 1951, com seus Protocolos posteriores, como os principais instrumentos na garantia dos direitos dos refugiados.

Focando no Brasil, discorremos sobre como a ratificação da Convenção de 1951 e seu Protocolo de 1967, juntamente com a Lei 9.474 de 1997, estabeleceram um quadro legal sólido para a proteção dos refugiados no país. E, através de tais legislações, o país se compromete a não apenas garantir refúgio, mas também a proporcionar oportunidades de integração e dignidade aos refugiados em seu território, servindo de exemplo aos seus pares na América do Sul.

Finalmente, destacamos as Diferenças entre Direitos dos Refugiados e Asilo Político, esclarecendo que enquanto o asilo político é concedido com base em perseguição política específica, o direito dos refugiados abrange aqueles que fogem de várias formas de perseguição, como a base racial, religiosa, de gênero ou orientação sexual. 

De modo geral, este texto, ainda que de modo resumido, tenta destacar a complexidade do direito dos refugiados e sua importância na proteção dos direitos humanos, com a ideia de disseminação do tema para melhor compreensão e aprimoramento contínuo do tema no cenário global.

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Conheça as referências deste artigo

JUBILUT, Liliana Lyra. O Direito Internacional dos refugiados e sua aplicação no orçamento jurídico brasileiro. São Paulo, Método, 2007.
PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. Salvador: JusPODIVM, 2018.
REZEK, J.F. Direito Internacional Público – Curso Elementar, Ed. Saraiva, 8a edição, 2000
SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. São Paulo: Atlas, 2002.
TÁVORA, Fabiano. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2016 – Coleção Diplomata)


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Luiz Paulo Yparraguirre é Mestre pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), Pós Graduado em Advocacia Empresarial (PUC) e em Direito Médico e Hospitalar (UCAM). Membro da World Association for Medical Law (WAML). Sócio do...

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