A audiência de custódia é um procedimento judicial realizado até 24 horas após a prisão, no qual a pessoa detida é apresentada a um juiz.
Desde 2015, em todo o país foram realizadas mais de um milhão e setecentas mil audiências de custódia, tendo havido a concessão de liberdade a mais de seiscentos e setenta mil pessoas.
O tema levanta questionamentos, principalmente, acerca da segurança pública e reincidência, mas a verdade é que as audiências de custódia cumprem um papel de extrema relevância social.
Neste texto vou falar mais sobre o objetivo da audiência de custódia e qual o papel do advogado. Continue a leitura! 😉
O que é audiência de custódia?
A audiência de custódia consiste na apresentação da pessoa presa a um Juiz no prazo de 24 horas após a prisão.
Nesta audiência, será analisada a prisão realizada sob os aspectos de regularidade e legalidade, bem como se é caso de manutenção da prisão ou não.
Qual a base legal da audiência de custódia?
A audiência de custódia ou de apresentação já tinha base legal desde 1992, quando foram introduzidos no ordenamento jurídico o Pacto de São José da Costa Rica (Decreto nº 678/92) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Decreto nº 592/92).
Contudo, apenas em 2015, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aprovou a Resolução nº 213/2015, regulamentando a audiência de custódia em todo o território nacional.
Atualmente, a audiência de custódia possui regramento específico (art. 310) no Código de Processo Penal (CPP), cuja inclusão se deu pela Lei 13.964/19 – popularmente conhecida como “pacote anti crime”, que também deu previsão legal ao Acordo de Não Persecução Penal (ANPP). Vejamos:
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente.
Qual o objetivo da audiência de custódia?
O objetivo da audiência de custódia é dar cumprimento ao Direito da pessoa presa de ser ouvida por um Juiz tão logo a sua prisão seja aperfeiçoada.
Além disso, a audiência vem atender ao comando constitucional previsto no Art. 5º, LXVI, da Constituição Federal de 1988, que diz:
Ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.
Na audiência de custódia, será analisada a prisão realizada, a necessidade de sua manutenção por meio de conversão em prisão preventiva, a possibilidade de concessão de liberdade provisória ao preso ou, ainda, se houve tortura ou maus tratos no momento da prisão.
Qual o papel do advogado na audiência de custódia?
É direito do preso entrevistar-se com seu advogado ou defensor, bem como é Direito do advogado se manifestar nesta audiência, fazendo seus requerimentos e juntando documentos indicados pelo preso ou familiar, sempre buscando o melhor Direito disponível.
Além disso, o advogado deve arguir tudo aquilo que for pertinente ao ato, como a ilegalidade da prisão em flagrante, erro na identificação do preso, invalidade do mandado de prisão, direito à liberdade provisória ou prisão domiciliar etc.
Quando deve ser realizada a audiência de custódia?
A audiência de custódia deve ser realizada no prazo de 24 horas após a prisão. Devemos entender que esse prazo se inicia tão logo haja a captura do preso, ou seja, se a prisão foi realizada às 13 horas, deve ser realizada a audiência até às 13 horas do dia seguinte.
Contudo, nem todo lugar consegue cumprir esse prazo de 24 horas, além de situações excepcionais como a própria demora na formalização da prisão em flagrante, de forma que seria correto perguntar: nesses casos, haveria nulidade pela demora?
O STF já respondeu este questionamento quando do julgamento do Agravo Regimental em Reclamação Constitucional nº 49566 “Rcl 49566 AgR”, onde estabeleceu que:
A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a não realização da audiência de custódia no prazo de 24 horas depois da prisão em flagrante constitui irregularidade passível de ser sanada, que nem mesmo conduz à imediata soltura do custodiado, notadamente quando decretada a prisão preventiva, como se deu na espécie.”
Contudo, deve a defesa ficar atenta e analisar o descumprimento do prazo previsto, bem como o prejuízo gerado à pessoa presa, o que pode levar à nulidade da prisão realizada.
Quais decisões o juiz pode tomar na audiência?
Há, principalmente, três decisões que o Juiz pode tomar na audiência de custódia (art. 310, CPP), vejamos:
Relaxamento da prisão
O Juiz pode “relaxar” a prisão em flagrante quando verificar alguma ilegalidade na prisão.
Concessão da liberdade provisória
O Juiz pode conceder a liberdade provisória à pessoa presa quando o fato e as condições pessoais do preso favorecerem essa decisão.
Quando é cabível a liberdade provisória?
A liberdade provisória é a regra no processo penal. Contudo, só será possível conceder a liberdade ao custodiado quando não estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva.
Decretar a prisão preventiva
Pode, ainda, o Juiz entender que a pessoa conduzida deva permanecer presa, momento em que decretará a sua prisão preventiva.
Além disso, o Juiz pode tomar decisões colaterais ao processo, como requerer apuração quando houver notícia de maus tratos, determinar a realização de exame de corpo de delito, requerer alguma diligência indicada pelas partes, ou seja, o Juiz tem a liberdade para determinar tudo aquilo que achar necessário e for congruente com o momento.
Como a audiência de custódia impacta o direito do preso?
Em regra, na audiência de custódia não são tratadas questões que dizem respeito ao fato que originou a prisão, a não ser que seja necessária para verificar eventual ilegalidade ou mesmo mudança de entendimento quanto ao fato (crime) imputado ao preso.
A audiência busca garantir a legalidade da prisão, bem como manter a prisão apenas daqueles cujas medidas cautelares diversas da prisão se mostrarem insuficientes, ou seja, resguardando o direito de liberdade a todos os demais.
Quais são os principais desafios para o advogado na audiência de custódia?
Os principais desafios do advogado na audiência de custódia estão relacionados à demonstração da efetiva ausência de necessidade de manutenção da prisão levada a efeito.
Muitas das vezes, a ausência de documentos hábeis a demonstrar a possibilidade de soltura ou mesmo uma postura mais rígida do Juízo e do próprio Ministério Público acabam negando o direito do preso de responder ao processo em liberdade.
Como sempre defendido, a prisão é a última medida, sendo necessária apenas em casos extremos ou cujas medidas cautelares diversas da prisão já decretadas se mostraram insuficientes.
O que fazer se for decretada a prisão preventiva na audiência de custódia?
Caso seja negado o pedido de liberdade provisória na audiência de custódia, pode o advogado optar por dois caminhos.
Como a audiência de custódia costuma ser realizada por Juiz diferente daquele para o qual o processo será distribuído, pode o advogado aguardar essa distribuição do processo para o Juiz que seguirá na ação penal e realizar um novo pedido de liberdade provisória, juntando outros documentos ou utilizando novos argumentos.
Caso prefira se insurgir imediatamente contra essa decisão denegatória, pode o advogado pedir um habeas corpus diretamente no Tribunal de Justiça do seu Estado, buscando a revisão da decisão que negou a liberdade.
Vejamos que não há recurso específico para a negativa de concessão de liberdade provisória, devendo, em todo o caso, ser utilizado o habeas corpus.
Audiência de custódia e abuso de autoridade:
A importância da audiência de custódia fica ainda mais evidente quando o legislador reconhece que impedir ou retardar, de forma, injustificada a sua realização, constitui crime. Vejamos:
Art. 19. Impedir ou retardar, injustificadamente, o envio de pleito de preso à autoridade judiciária competente para a apreciação da legalidade de sua prisão ou das circunstâncias de sua custódia:
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena o magistrado que, ciente do impedimento ou da demora, deixa de tomar as providências tendentes a saná-lo ou, não sendo competente para decidir sobre a prisão, deixa de enviar o pedido à autoridade judiciária que o seja.
Neste caso, deve o advogado pleitear, quando da realização do ato, que haja expedição de ofício para apuração do quanto relatado.
Como garantir a efetividade da defesa na audiência de custódia?
Ao advogado, cabe ter ciência de todas as condições pessoais do seu cliente, como trabalho, estado civil, se possui filhos, a idade deles, se é o único responsável ou não, se trabalha, quanto ganha, bem como a conhecer todas as circunstâncias do fato criminoso imputado e as condições de regularidade da prisão efetuada.
Com todas essas informações, já é possível prever o resultado da audiência de custódia, sendo certo que nem sempre a liberdade é o melhor resultado disponível, até mesmo porque algumas prisões como ocorre com o cumprimento de mandado de prisão temporária ou preventiva, não podem ser revistas em audiência de custódia (apenas pelo Juiz prolator da decisão), exceto quando a ilegalidade for evidente.
Conclusão
Ao olhar o número de audiências realizadas e a quantidade de liberdades que foram concedidas, verifica-se que muitas prisões desnecessárias foram evitadas, e que as necessárias foram confirmadas e chanceladas pelo poder judiciário.
Além disso, todos ganham quando verificamos que mais de cento e trinta mil denúncias de tortura e maus tratos foram registradas e, talvez, boa parte apurada, garantindo, assim, que as polícias adotem normas mais rigorosas para prevenir tais ocorrências.
A audiência de custódia possui uma grande importância na garantia de Direitos previstos na Constituição Federal e nas demais leis já citadas, de modo que deve contar com o apoio de todos os interessados. Afinal, como “supostamente” dito por Dostoiévski “O grau de civilização de uma sociedade pode ser julgado pela maneira como trata seus prisioneiros”.
Mais conhecimento para você
Se você gostou desse texto, continue a leitura em artigos sobre os seguintes temas:
- Princípios do direito empresarial: veja os mais importantes
- Compliance: o que é e qual a sua importância
- Assessoria jurídica: o que um advogado precisa saber
- Execução de alimentos: o que mudou com o Novo CPC
- Prescrição intercorrente: saiba tudo sobre o tema
- Joint venture: o que um advogado precisa saber
Gostou do texto? Ficou com alguma dúvida sobre due diligence e sobre a atuação do advogado nesse procedimento? Compartilhe com a gente nos comentários abaixo!
Advogado Criminalista há 8 anos; Bacharel em Administração de Empresas: Especialista em Processo Penal; Especialista em Processo Civil; Especialista em Direito do Trabalho; Atuação em Direito Penal Econômico, Ambiental e Empresarial. Diretor da Comissão da Jovem Advocacia da Abracrim - SP....
Ler maisDeixe seu comentário e vamos conversar!
Deixe um comentário