Fashion Law ou direito da moda é um campo relativamente novo do direito que surgiu da necessidade de abordar as complexas questões legais enfrentadas pela indústria da moda, desde os aspectos iniciais do ciclo de vida de uma peça até quando o produto chega ao guarda-roupa do consumidor.
O termo “Fashion Law” foi cunhado por Susan Scafidi, que é a criadora do Fashion Law Institute. Susan aborda que as soluções jurídicas podem surgir em diferentes fases:
- Propriedade Intelectual: por meio da proteção das Criações, incluindo designs e marcas;
- Negócios e finanças: abrange categorias como o direito do trabalho, imobiliário e contratos em geral;
- Comércio Internacional: inclui questões de segurança e regulamentação;
- Direito do Consumidor: trata do direito dos consumidores no contexto do mercado fashion.
E para quem pensa que a moda se limita a roupas e acessórios, está muito enganado, pois a moda inclui modelagem, mídia, indústrias da beleza e até fragrâncias.
Então, continua comigo, pois trataremos de várias curiosidades e eu tenho certeza de que você jamais imaginou sobre essa relação do mundo da moda com o direito. 🤓
O que é o Fashion Law?
O direito da moda envolve a representação de clientes que atuam nos mais diversos setores da indústria, como o design, a fabricação, distribuição, varejo e até mesmo os consumidores.
Por ser relativamente novo, exige muita atenção a contratos, licenças e outros aspectos, mas também aborda muitos conflitos estruturais.
Exemplos de Fashion Law
Um exemplo são os fabricantes locais de importadores e a relação com a mão de obra que está sendo utilizada, além dos designs criativos das empresas de fast fashion que frequentemente entram em disputa sobre plágio e direitos autorais.
O Fashion Law conecta direito e moda, então se você já tem uma predisposição a gostar de moda vai gostar das coisas que eu vou te contar.
História e evolução do Fashion Law
No início do século passado, a indústria da moda era predominante concentrada na costa leste dos Estados Unidos, onde até se contratavam advogados, mas nem todos tinham consciência ou sabiam das implicações para proteger seus clientes.
Hoje, podemos dizer que a indústria da moda não é mais confinada apenas a uma região e é mais fragmentada.
Para que o empresário da moda tenha certeza acerca de que suas marcas estão registradas, obtenha licenças globais, até para que lojas de varejo estreitam suas relações com fornecedores é preciso que o advogado entenda não só sobre juridiquês, mas sobre moda.
O crescimento mundial da indústria da moda, sua globalização e o surgimento de marcas enormes impulsionaram a demanda por especialistas advogados que entendem de moda e de direito.
No Brasil, podemos ressaltar a contribuição da Dra. Deborah Portilho, pois é tida como uma das pioneiras e principais referências nessa área.
Deborah é advogada e organizou e coordenou os primeiros cursos de extensão em Fashion Law no Brasil, começando no Ibmec/Rio em 2014 e, posteriormente, em São Paulo, na ESA-OAB/SP, contribuindo para a formação de uma nova geração de advogados especializados, completamente na vanguarda.
Em 2016, ela idealizou e passou a presidir a Comissão de Direito da Moda (CDMD) da OAB/RJ, consolidando o espaço institucional do Fashion Law no Brasil e promovendo discussões relevantes no setor, como esta que conta com a participação de Susan Scafidi:
Além disso, podemos dizer que sua dissertação de mestrado com mais de 300 páginas, intitulada “A Propriedade Intelectual na Indústria da Moda: formas de proteção e modalidades de infração”, é um marco acadêmico.
Por que o Fashion Law é importante?
Quem nunca viu por aí as icônicas bolsas de monograma bem diferentes das originais?
E esse é apenas um exemplo, por isso, um dos eventos cruciais para o desenvolvimento do direito da moda foi a questão da pirataria. Leiam comigo: fomos da pirataria a proteção.
Aqui, para os que, como eu, amam saber dos casos, vou trazer alguns que foram surgindo antes mesmo que falássemos em Fashion Law.
O primeiro deles foi Millinery Creators Guild, Inc. v. Federal Trade Commission (1940), seguido por Fashion Originators’ Guild of America, Inc. v. Federal Trade Commission (1941) que tratavam sobre pirataria de estilo na indústria da moda.
No caso de Millinery Creators Guild um grupo de fabricantes de chapéu fez uma associação comercial para combater a pirataria de estilo e estabelecer preços mínimos, o objetivo era limitar a competição daqueles que copiavam seus designs.
No entanto, o tribunal reconheceu que mesmo sendo cópia, os chapéus eram uma competição desejável para os consumidores.
Já o caso Fashion Originators Guild, envolveu uma situação semelhante que acabou criando monopólio, excluindo os fabricantes e distribuidores que não seguiam suas regras. Ambos perderam, considerando que a competição era saudável para a economia e consumidores.
Hoje, mundialmente falando, temos legislações que oferecem uma proteção mais robusta para o design de moda, que tentam balancear com o reconhecimento da importância da concorrência e a necessidade de evitar práticas que tornem o mercado não competitivo.
Um marco para o Fashion Law, foi o estabelecimento do Fashion Law Institute em 2010, sob a liderança de Susan Scafidi, com o apoio do Council of Fashion Designers of America (CFDA), que tem como objetivo educar a próxima geração de advogados de moda e fornecer recursos para a indústria.
Mais liberdade no dia a dia
Aspectos legais importantes no Fashion Law
O Fashion Law se concentra na proteção das criações e interesses da indústria da moda, com uma relação significativa com a área de Propriedade Intelectual (PI), que, por sua vez, aborda mecanismos das formas legais de proteção às criações originais da mente humana.
Poderemos aplicar a PI a fim de proteger aspectos específicos das criações, por meio de:
- Marcas registradas: elementos distintivos que compõem o trade dress;
- Direitos autorais: protegem obras originais, desenhos, estampas e elementos específicos;
- Desenhos industriais: protegem aspectos ornamentais;
- Patentes: podem proteger tecnologias têxteis;
Casos emblemáticos no Fashion Law
Agora que já fizemos uma introdução teórica e você já sabe as bases desse ramo do Direito, vamos aos casos judiciais mais emblemáticos:
Christian Louboutin vs. Yves Saint Laurent
Quem não conhece os famosos sapatos das solas vermelhas? Os objetos de desejo da maioria das mulheres: os louboutins.
A marca do designer francês é conhecida pelas icônicas solas vermelhas e recentemente entrou em uma disputa com a Saint Laurent que estava vendendo sapatos vermelhos com solas vermelhas.
Louboutin ganhou em alguns países, como nos Estados Unidos, resultando na proteção de solados vermelhos em sapatos que destroem a cor da sola. Já no Brasil, o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) negou a proteção à marca.
Tiffany (NJ), Inc. vs. eBay, Inc (2010) e Louis Vuitton Malletier vs. Akanoc Solutions (2011)
Ambos os casos abordam a complexa questão da responsabilidade de plataformas online por violação de marcas registradas por seus usuários.
Em ambos os casos, marcas de luxo buscam responsabilizar plataformas de terceiros por facilitar a venda de produtos falsificados.
No entanto, os tribunais chegaram a conclusões diferentes, destacando as nuances legais da violação de marcas registradas em ambientes online.
Em Tiffany vs. eBay, a decisão foi a favor do eBay em todas as acusações, pois reconheceu o esforço da plataforma e suas medidas antifraude.
Em contraste, no caso Louis Vuitton vs. Akanoc Solutions, a Louis Vuitton processou a Akanoc Solutions e a Managed Solutions Group, empresas de hospedagem na web, depois de descobrir sites que vendiam produtos falsificados da Louis Vuitton. Ao contrário do eBay, os réus neste caso ignoraram os avisos da Louis Vuitton sobre a violação.
A decisão foi a favor da Louis Vuitton, concluindo que a Akanoc e a Managed Solutions Group tinham conhecimento da atividade infratora e não tomaram medidas para impedi-la.
Hermès vs. 284
A icônica marca Hermès processou a marca brasileira 284 por fazer uma bolsa parecida com a Birkin. Neste caso, a marca brasileira teve que interromper a venda das bolsas.
E esses são só alguns casos icônicos sobre fashion law!
Como atuar profissionalmente em Fashion Law?
Hoje já vemos uma proliferação de cursos de pós-graduação em Direito da Moda, e publicações especializadas, como The Little Book of Fashion Law de Ursula Furi-Perry, que é um compêndio de artigos sobre o tema, mas ainda temos pouco material de estudo.
Precisamos reconhecer que, diante disso, a melhor teoria é a prática, então a busca por conhecimentos de ordem realmente prática junto a advogados já atuantes fornece aos aspirantes a advogados de moda os conhecimentos e as habilidades necessárias para navegar pelas complexidades do setor.
Aqui indico beber direto da fonte com cursos rápidos e pós-graduações na área:
- https://www.fordham.edu/school-of-law/admissions/msl-admissions/msl-in-fashion-law/
- https://abapi.org.br/curso-de-fashion-law/
Mercado de trabalho para Advogados de Moda
Sabemos que o Brasil possui mais de 1,5 milhão de advogados, mas por ser uma área relativamente complexa devido às suas particularidades e a globalização da indústria da moda, cria um campo rico de atuação multidisciplinar.
Isso porque, combina direitos como: propriedade intelectual, contratual, consumidor, internacional, tributário e trabalhista.
As oportunidades não faltam, seja por meio de:
- Elaboração e análise de contratos com fornecedores, modelos, eventos etc;
- Consultoria jurídica para marcas;
- Contratos de licenciamento (quem não viu crocs que não são crocs ou venda de camisetas de personagens da Disney?)
- Representação de marcas;
- Gestão extrajudicial de litígios;
- Assessoria para práticas de sustentabilidade ambiental;
- Assessoria para garantir que a mão-de-obra não seja análoga à escrava;
Qual o futuro do Fashion Law?
A Inteligência Artificial (IA) e a velocidade com que a tecnologia vem avançando nos últimos tempos está realmente acelerada, eu, inclusive defendo que estamos vivendo uma nova revolução, similar a revolução industrial.
Hoje já temos a criação de designs direto por IA o que gera um debate acerca da violação ou não da propriedade intelectual, pois o Chat GPT “Generative Pre-trained Transformer“, por exemplo, é um modelo de IA de LLM (Large Language Model) que foi treinado para processar, entender e gerar resultados baseados em dados previamente inseridos.
O que nos traz para essa discussão: Se uma IA cria um design, quem é o autor? Os designs gerados por IA são elegíveis para proteção de direitos autorais, ou ficam no domínio público?
Por outro lado, a IA ajuda a prever quais produtos terão maior demanda por região.
Sabe aquele anúncio que te persegue da blusinha ou sapato que você quer comprar? Baseiam-se em dados e análise desses dados para que cada vez mais se utilize de um anúncio fortemente personalizado.
Quando parece que seu celular te escuta? O tal do algoritmo? Isso tudo já afeta e vai afetar ainda mais não só o Fashion Law, mas as relações humanas como um todo.
O site da Lancôme que com base em IA indica a melhor cor de base para você.
E já que estou falando desse tema que me anima tanto, vou falar sobre NFTs ou tokens não fungíveis. Os NFTS são ativos digitais baseados na tecnologia blockchain que funcionam como uma propriedade de itens digitais.
Recentemente diversas marcas criaram coleções inteiramente digitais que foram vendidas no metaverso. Marcas como Adidas, Louis Vuitton, Nike, Dolce-Gabbana, Prada e Gucci venderam mais de 300 milhões em NTFs.
E não foram só as marcas oficiais que se beneficiaram do mercado de NFTs, pois a Hermès acabou processando uma marca aleatória que estava vendendo NFT das bolsas Birkin, baseada justamente na propriedade intelectual.
Então, vai me dizer que a tecnologia não terá grande impacto no Fashion Law?
Conclusão
O Fashion Law é uma área relativamente nova do Direito e promete muitas oportunidades, pois tem opções de atuação para praticamente todos os campos do direito, ou seja, para todos os gostos. Aqui embaixo, eu vou deixar uma lista de livros caso você tenha mais interesse no assunto:
- “Fashion Law: A Guide for Designers, Fashion Executives, and Attorneys” por Guillermo C. Jimenez e Barbara Kolsun;
- “The Little Book of Fashion Law” por Ursula Furi-Perry;
- “Fashion Law and Business: Brands & Retailers” por Lois F. Herzeca e Howard S. Hogan;
- “Fashion Law: Cases and Materials” por Barbara Kolsun e Guillermo C. Jimenez
- “Fashion Law FAAP – O encontro do direito com a moda, vários autores”;
Espero que você tenha gostado da leitura e tenha a visão de que o Fashion Law pode ser o equilíbrio entre tendência e regulamentação.
Aguardo você no próximo artigo!! 🥰
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E você, já conhecia o fashion law? Compartilhe com a gente suas impressões sobre a especialidade nos comentários abaixo!
Advogada desde 2012, foi professora Universitária e Oficial R2 da Força Aérea. Atualmente atua na área consultiva contratual. Certificada pela Arquitetura dos Contratos, de Fernanda Moreira e com certificação Societário Total da Universidade Corporativa Conexão Legal, de Fernanda Bastos. Fundadora...
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