O crime de cárcere privado consiste em impedir, de maneira ilegal, que alguém exerça sua liberdade de ir e vir, mantendo a pessoa retida em um espaço limitado do qual não consegue se libertar. Essa conduta está prevista no artigo 148 do Código Penal Brasileiro e viola o direito fundamental à liberdade individual.
Muita gente ainda confunde cárcere privado com sequestro. Isso acontece porque, especialmente nos anos 1990, os crimes de sequestro envolviam também o cárcere privado, já que a vítima era mantida presa até que a família pagasse o resgate.
Naquela época, o Brasil chegou a ocupar o segundo lugar no mundo em risco de extorsão mediante sequestro, e muitos casos tiveram grande repercussão nacional. Desde então, esses dois termos ficaram muito associados no imaginário popular.
Apesar disso, é importante entender que sequestro e cárcere privado não são a mesma coisa. Ambos envolvem a restrição da liberdade de alguém, mas de formas diferentes, e por isso geram consequências jurídicas específicas.
Neste artigo, você vai entender de forma simples como funciona o crime de cárcere privado, suas diferenças em relação ao sequestro, quais são as penas previstas, quando se aplica a Lei Maria da Penha e como denunciar esse tipo de violência. Continue a leitura. 😉
O que é o cárcere privado?
O cárcere privado acontece quando alguém tira a liberdade de outra pessoa de forma ilegal, mantendo-a presa em um espaço sob seu controle. Isso vale até quando a vítima é impedida de sair da própria casa.
Já houve vários casos que chamaram atenção no mundo, como os de Elisabeth Fritzl e Natascha Kampusch (história contada no filme 3.096 dias de cativeiro). No Brasil, em setembro de 2025, saiu na mídia o caso de uma mulher que ficou mais de 20 anos em cativeiro em Aráucária/PR.
A lei não define um tempo mínimo. Basta que a pessoa seja impedida de ir e vir por um período considerado relevante. Se for algo muito rápido, pode ser visto como tentativa ou até outro crime.
Diferença entre sequestro e cárcere privado
Os dois crimes tiram a liberdade da vítima, mas de formas diferentes.
- Cárcere privado: a pessoa fica presa em um espaço pequeno e fechado, como um quarto ou uma sala.
- Sequestro: a vítima é levada para outro lugar, sob controle do autor, mesmo que seja um espaço aberto.
Como explica Bitencourt:
[…] estritamente, se possa dizer que no cárcere privado há confinamento ou clausura, enquanto no sequestro a supressão da liberdade não precisa ser confinada em limites tão estreitos. Assim, pode-se encarcerar alguém em um quarto, em uma sala, em uma casa etc.; e pode-se sequestrar retirando-o de determinado lugar e levando-o para outro, como para uma ilha, um sítio etc.” (2019, p. 602).”
Ele também lembra que os dois podem acontecer juntos: a vítima pode ser sequestrada e depois mantida presa em um quarto ou em uma casa usada como cativeiro.
Qual a pena para cárcere privado?
A punição depende das circunstâncias: quanto mais grave for a situação e maiores os riscos ou danos à vítima, mais alta será a pena prevista em lei.
Forma simples (art. 148, caput)
Prisão de 1 a 3 anos.
Forma qualificada (art. 148, §1º)
Prisão de 2 a 5 anos, quando:
- a vítima é parente próximo, cônjuge ou tem mais de 60 anos;
- a vítima é internada em hospital ou clínica sem autorização;
- a privação dura mais de 15 dias;
- a vítima é menor de 18 anos;
- o crime tem finalidade sexual.
- Forma mais grave (art. 148, §2º): prisão de 2 a 8 anos, se houver maus-tratos ou grande sofrimento físico ou psicológico.
O cárcere privado tem fiança?
Sim. Quem responde por cárcere privado pode solicitar fiança, pois esse crime não se enquadra entre os considerados inafiançáveis pela Constituição.
- Na forma simples, a fiança pode ser dada pelo delegado.
- Nas formas qualificadas, só o juiz pode decidir.
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Cárcere privado e a Lei Maria da Penha
A Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006) protege mulheres em situação de violência doméstica. Mesmo sem citar o cárcere privado de forma direta, a lei se aplica porque restringir a liberdade de uma mulher é uma forma de violência.
O art. 7º, II, fala em violência psicológica, que inclui isolamento, vigilância constante e limitação do direito de ir e vir:
Art. 7º. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras.
II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
Por isso, a vítima pode pedir medidas protetivas, como afastar o agressor do lar, proibir o contato e garantir apoio policial e psicológico. Assim, a Lei Maria da Penha reforça a proteção de mulheres submetidas ao cárcere privado no ambiente doméstico.
Como denunciar o cárcere privado?
Se você presenciar ou for vítima de cárcere privado, os canais de denúncia são:
- Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher
- Funciona 24h, todos os dias, em qualquer lugar do Brasil.
- Atendimento gratuito e sigiloso.
- Funciona 24h, todos os dias, em qualquer lugar do Brasil.
- WhatsApp da Central – (61) 9610-0180
- Canal por chat para denunciar sem precisar falar ao telefone.
- Também disponível via QR Code no site gov.br.
- Canal por chat para denunciar sem precisar falar ao telefone.
- Polícia Militar – 190
- Para situações de emergência, acione primeiro o 190.
- A PM presta atendimento imediato e adota as medidas iniciais.
- Para situações de emergência, acione primeiro o 190.
Em 2024, foram registradas 691.444 denúncias de violência doméstica em todo o país. Destas, 3.027 eram de cárcere privado (Gov.br, Secom, 2025).
Conclusão
O cárcere privado é uma grave violação do direito de ir e vir e pode ocorrer em diferentes situações, inclusive dentro da própria casa da vítima. A lei não exige tempo mínimo para que o crime se configure, bastando que a restrição seja relevante para caracterizar a ofensa.
As penas variam conforme a gravidade do caso e podem ser aumentadas diante de fatores como vulnerabilidade da vítima ou sofrimento imposto. Quando ocorre em ambiente doméstico, o crime também se enquadra como violência psicológica, sendo amparado pela Lei Maria da Penha.
O enfrentamento desse delito depende da consciência social e do uso dos canais de denúncia disponíveis, como o 180 e o 190. Esses mecanismos são fundamentais para proteger as vítimas e garantir a preservação da liberdade.
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Conheça as referências deste artigo
CALDEIRA, César. Política anti-seqüestros no Rio de Janeiro: 1995/1998. O Alferes, Belo Horizonte, 15 (52): 13-46, jul./dez. 2000.
WOLF, Carolina et al. ‘Falava que nossa separação seria só a morte’: jovem mantida 22 anos em cárcere privado pelo padrasto detalha ameaças. G1, 19 set. 2025.
FONTANA, B. F., & Ruschel, J. (2024). As mulheres vítimas de violência doméstica: cárcere privado e a falta de visibilidade. Revista Contemporânea, 4(8), e5436.
JALIL, Mauricio S.; FILHO, Vicente G. Código penal comentado: doutrina e jurisprudência. 7. ed. Barueri: Manole, 2024. E-book. p.686. ISBN 9788520461945.
BITENCOURT, Cezar R. Código penal comentado. 10. ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2019. E-book. p.601. ISBN 9788553615704.
Advogado (OAB 75.386/PR e 22.455A/MS), sócio do Alencar & Pressuto em Campo Grande-MS. Bacharel em Direito e especialista em Ciências Criminais pela PUC/PR. Possui larga experiência em procedimentos de inclusão em penitenciárias federais. Hoje atua exclusivamente na assessoria empresas, urbanas...
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