A Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101/2005) regula a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência de empresários e sociedades empresárias no Brasil. Em 2020, essa Lei de Falências e Recuperação Judicial foi atualizada pela Lei nº 14.112/2020, que modernizou seus procedimentos. A recuperação judicial é um processo destinado a evitar o fechamento de empresas em crise financeira. Seu objetivo é garantir a continuidade das atividades, preservar empregos e possibilitar o pagamento dos credores.
Imagine uma rede de padarias ou uma indústria local com dívidas acumuladas: o empresário pode recorrer à Justiça para tentar salvar o negócio, ou, em último caso, encerrar as atividades de forma ordenada.
Esse tema tem ganhado destaque, pois o Brasil viu um recorde de pedidos de recuperação judicial: em 2024 houve um aumento de 61% em relação a 2023 (CNN).
Esse crescimento ressalta a importância de entender a legislação vigente e as recentes mudanças em sua estrutura.
Na leitura a seguir, mostramos como a lei funciona, o que mudou com a Lei 14.112/20 e quais são as principais diferenças entre recuperação judicial e falência, de modo claro e acessível.
Continue a leitura 😉
O que é falência?
A falência é um processo judicial que ocorre quando uma empresa ou empresário não consegue mais pagar suas dívidas e a Justiça reconhece oficialmente essa situação.
Em outras palavras, é a constatação de que o negócio não tem condições financeiras de continuar operando. A partir daí, a empresa precisa encerrar suas atividades, e seus bens são reunidos e vendidos para pagar os credores, seguindo uma ordem estabelecida pela lei.
Durante o processo de falência, um administrador judicial é nomeado para cuidar da arrecadação e venda dos bens, além de garantir que tudo ocorra de forma justa e transparente.
O dinheiro obtido com a venda é usado para quitar as dívidas, começando por aquelas que a legislação considera prioritárias, como salários e tributos.
A falência costuma encerrar a empresa e gerar demissões, mas, após cumprir as obrigações legais, permite ao empresário se reerguer e voltar ao mercado — fechando um ciclo difícil e abrindo caminho para um recomeço.
O que é a recuperação judicial?
A recuperação judicial é um mecanismo que oferece uma “segunda chance” para empresas com dificuldades financeiras.
É um processo em que a empresa pede ajuda à Justiça para suspender temporariamente as cobranças e renegociar suas dívidas com os credores.
Para isso, ela apresenta um plano de pagamento que mostre como pretende se reorganizar e voltar a operar de forma saudável e sustentável.
Durante a recuperação judicial, a empresa não fecha as portas — ela continua funcionando, mantendo empregos e contribuindo para a economia.
O plano de recuperação pode incluir prazos maiores para pagamento, parcelamentos, descontos ou outras condições que tornem possível quitar as dívidas.
Ao contrário da falência, que busca encerrar e liquidar a empresa, a recuperação judicial tem como objetivo principal preservar o negócio, proteger os empregos e dar à empresa a oportunidade de se reerguer e seguir em frente.
Quais as principais diferenças entre falência e recuperação judicial?
Quando uma empresa enfrenta graves dificuldades financeiras, dois termos jurídicos surgem com frequência: Falência e Recuperação Judicial. Embora ambos tratem de dívidas, seus objetivos e consequências são opostos.
A principal diferença é simples:
- A Recuperação Judicial busca salvar a empresa e permitir que ela continue funcionando.
- A Falência encerra as atividades da empresa para pagar os credores.
Como funciona o processo de recuperação judicial?
O processo de recuperação judicial começa quando a empresa comprova à Justiça que atua regularmente há pelo menos dois anos e está passando por dificuldades financeiras.
Após o juiz aceitar o pedido, inicia-se um procedimento definido pela Lei nº 11.101/2005 (LREF), dividido em etapas com prazos específicos.
1. Suspensão das cobranças (moratória):
A empresa ganha até 180 dias de proteção contra cobranças e execuções, para negociar com os credores e preparar seu plano de recuperação.
2. Apresentação do plano:
Dentro de 60 dias após a decisão judicial, a empresa deve apresentar um plano de recuperação, explicando como pretende pagar suas dívidas — com propostas como parcelamentos, descontos e prazos de carência.
3. Análise dos credores:
Após a publicação do plano e da lista de credores, eles têm 30 dias para contestar valores ou apresentar objeções.
4. Assembleia-Geral de Credores:
O juiz convoca uma reunião (em até 150 dias) para que os credores votem o plano. Se aprovado, ele é homologado e começa a ser executado.
5. Cumprimento do plano:
A empresa deve seguir as condições acordadas em até 2 anos, conforme determina a lei.
Se o plano for rejeitado, a Lei nº 14.112/2020 permite que os próprios credores apresentem uma proposta alternativa, evitando que o processo seja automaticamente convertido em falência.
Em resumo: a recuperação judicial oferece tempo e condições para que a empresa se reorganize, preserve empregos e volte a crescer, em vez de encerrar suas atividades.
Quem pode requerer a recuperação judicial ou a falência?
A recuperação judicial pode ser pedida por empresários individuais e empresas que estejam com dificuldades financeiras, desde que atuem legalmente e tenham pelo menos dois anos de atividade comprovada.
A Lei nº 14.112/2020 também passou a permitir que produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas, façam o mesmo pedido, se comprovarem dois anos de atuação (com documentos como a Escrituração Contábil Fiscal ou o Livro Caixa Digital).
Alguns tipos de empresas não podem pedir recuperação judicial, como empresas públicas, bancos, seguradoras e cooperativas de crédito.
Já a falência pode ser solicitada por qualquer credor que tenha uma dívida acima de 40 salários-mínimos comprovada por um título válido (como cheque protestado ou decisão judicial).
O próprio empresário também pode pedir sua falência voluntária se reconhecer que não tem condições de pagar as dívidas.
Quais são os direitos dos trabalhadores em caso de falência?
Com a falência da empresa, todos os contratos de trabalho são encerrados automaticamente, e os empregados passam a ter direito às verbas rescisórias previstas na CLT.
Isso inclui salários atrasados, férias vencidas e proporcionais (com o adicional de 1/3), 13º salário proporcional, multa de 40% do FGTS e o saque do FGTS.
Quem cumprir o período mínimo de trabalho exigido também pode solicitar o seguro-desemprego. A Lei de Falências garante prioridade no pagamento das dívidas trabalhistas, até o limite de 150 salários-mínimos por trabalhador, ou seja, esses valores são pagos antes de outros credores, por terem natureza alimentar.
Na prática, porém, como a maioria das empresas falidas possui poucos recursos, os pagamentos podem demorar, ser parcelados ou sofrer reduções. Em muitos casos, o trabalhador precisa habilitar seu crédito no processo falimentar para receber o que for possível.
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Recuperação judicial do produtor rural (Lei n. 14.112/2020).
A Lei nº 14.112/2020 trouxe uma inovação importante ao reconhecer expressamente o direito do produtor rural, pessoa física ou jurídica, de pedir recuperação judicial.
Antes, não havia previsão clara para isso. Agora, o produtor precisa comprovar pelo menos dois anos de atividade, por meio de documentos contábeis ou do Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR).
A mudança reflete a relevância do agronegócio para a economia e criou regras específicas nos arts. 70 e 71 da Lei de Recuperação e Falências (LREF), com condições diferenciadas:
- Plano de recuperação simplificado
- Dívidas de até R$ 4,8 milhões;
- Pagamento em até 36 parcelas;
- Carência máxima de 180 dias;
- Juros limitados à taxa SELIC.
- Dívidas de até R$ 4,8 milhões;
A lei também define quais créditos têm prioridade de pagamento (extraconcursais), como:
- Empréstimos com garantia fiduciária;
- Contratos com reserva de domínio;
- Financiamentos para compra de terras feitos nos últimos três anos;
- Cédula de Produto Rural (CPR), com tratamento distinto:
- CPR física (como nas trocas “barter”) → fica fora da recuperação judicial;
- CPR financeira → pode ser incluída no plano, salvo se garantida por alienação fiduciária.
- CPR física (como nas trocas “barter”) → fica fora da recuperação judicial;
Essas regras buscam adequar a recuperação judicial à realidade do campo, preservando as particularidades do crédito e do financiamento rural.
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Quais são os efeitos da declaração de falência?
Quando a Justiça decreta a falência de uma empresa, vários efeitos passam a valer imediatamente. O juiz nomeia um administrador judicial, responsável por levantar todos os bens, valores, contratos e dívidas da empresa — o chamado acervo da massa falida.
A partir da decretação, todas as ações e execuções contra o devedor ficam suspensas, exceto as trabalhistas, para evitar pagamento em duplicidade.
O falido (empresa ou empresário) não pode mais vender bens, contrair dívidas ou administrar livremente o patrimônio.
Em seguida, inicia-se a liquidação dos ativos: os bens são vendidos — por leilão, venda direta ou até pela venda da empresa como um todo — para gerar recursos.
O valor arrecadado é distribuído aos credores, conforme a ordem de prioridade legal (trabalhistas, com garantia real, quirografários, entre outros).
Na maioria dos casos, a falência resulta no encerramento definitivo da empresa e na inabilitação dos sócios para exercer atividade empresarial por determinado período.
Em situações excepcionais, a empresa (ou parte dela) pode ser vendida em bloco (art. 140 da LREF) a outro empresário, permitindo a continuidade das operações sob nova gestão.
O que é a Lei 11.101/2005 e quais seus pontos mais relevantes?
A Lei nº 11.101/2005, conhecida como Lei de Falências e Recuperação de Empresas (LREF), estabeleceu as bases do sistema atual de recuperação judicial, extrajudicial e falência empresarial.
Ela introduziu mecanismos como a divisão em classes de credores, a criação do Comitê de Credores e regras detalhadas para assembleias e planos de recuperação.
Ao longo dos anos, a lei passou por alterações pontuais. Entre elas, destaca-se a Lei Complementar nº 147/2014, que trouxe medidas específicas para micro e pequenas empresas, como:
- Limite de 2% do valor devido para os honorários do administrador judicial nesses casos (mantendo 5% para as demais empresas);
- Criação de uma quarta classe de credores, formada por microempresas e empresas de pequeno porte, garantindo sua participação própria nas votações da assembleia geral.
A Lei nº 14.112/2020 promoveu a reforma mais ampla da LREF, modernizando dispositivos e adaptando o sistema às novas realidades econômicas.
Em síntese, a LREF original instituiu os principais instrumentos de recuperação e falência, e as reformas posteriores buscaram tornar o processo mais ágil, inclusivo e eficiente, especialmente para pequenas empresas e para a negociação de dívidas tributárias.
Principais mudanças promovidas na LREF pela Lei 14.112/2020
A Lei nº 14.112/2020 entrou em vigor em janeiro de 2023 (com alguns vetos) e introduziu várias novidades à Lei de Falências. Destacam-se:
Autorização de novos empréstimos
Agora é legal um empresário ou seus sócios tomarem empréstimos (até de parentes) para financiar o negócio durante a recuperação. Esses empréstimos podem até usar bens pessoais como garantia, e, se a empresa falir antes de receber os recursos, o contrato é extinto sem multas.
Planos alternativos
Antes, se o plano de recuperação apresentado pela empresa fosse rejeitado, a única saída era declarar falência. Com a nova lei, os próprios credores podem elaborar um plano substitutivo se o da empresa for rejeitado. Isso dá uma segunda chance de rearranjar as dívidas sem encerrar o processo de recuperação.
Parcelamento tributário estendido
Foram facilitadas formas de parcelar dívidas fiscais. Agora o débito tributário pode ser parcelado em até 120 prestações, e débitos federais (IR e CSLL sobre ganho de capital) podem ser pagos em condições especiais. Isso alivia a carga fiscal imediata das empresas em crise.
Alienação de ativos digitalizada
A venda de bens (em falência) ou de partes da empresa (em recuperação) não exige mais anúncios em jornal impresso. Leilões eletrônicos, presenciais ou híbridos são expressamente permitidos, conforme o CPC, tornando o processo de venda mais rápido e menos burocrático.
Responsabilidade dos sócios
A nova lei reforça a autonomia patrimonial da empresa. Em regra, não há “penhora” automática dos bens dos sócios quando a empresa fali. Só em casos de fraude ou confusão patrimonial (desvio de finalidade) pode-se desconsiderar a personalidade jurídica.
Em contrapartida, os sócios e acionistas não podem receber lucros ou dividendos durante o processo de recuperação judicial. Pagar dividendos antes de aprovar o plano é considerado fraude contra credores, sujeito a punições (prisão de 3 a 6 anos e multa).
Essas mudanças buscam dar fôlego extra às empresas: facilitam obtenção de caixa, ampliam negociações e protegem tanto sócios quanto credores em situações abusivas.
O reconhecimento formal de novas modalidades de RJ (como para produtores rurais) e a ênfase em meios eletrônicos refletem a tendência de modernizar o sistema.
Conclusão
A Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101/2005), com suas alterações, é o principal instrumento jurídico para lidar com crises empresariais no Brasil.
Ela diferencia com clareza os conceitos de falência e recuperação judicial, define etapas e prazos rigorosos e busca equilibrar os direitos dos credores com a possibilidade de reestruturação das empresas.
As mudanças recentes, especialmente trazidas pela Lei nº 14.112/2020, modernizaram o sistema, permitindo novas formas de financiamento, procedimentos mais simples (como leilões eletrônicos) e a inclusão dos produtores rurais entre os que podem pedir recuperação.
Para os empresários, conhecer essas regras é fundamental: compreender prazos, direitos trabalhistas, custos e etapas do processo faz diferença na estratégia de superação da crise.
Embora a lei ofereça instrumentos para evitar a falência, a recuperação de empresas ainda é desafiadora, e a taxa de sucesso permanece baixa.
Mesmo assim, entender o funcionamento e as inovações da legislação ajuda a tomar decisões mais conscientes e aumentar as chances de recuperação ou de redução das perdas.
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Conheça as referências deste artigo
Advogado (OAB 51419/SC). Sócio de Bertoncini, Gouvêa & Tissot Advogados, onde atua nas áreas de Direito Civil, Direito Empresarial, Direito dos Contratos, Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor. Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pós-graduado em...
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Objetivo é esclarecedor sobre o assunto de recuperação judicial e falência.
Abordagem dos principais tópicos com bastante clareza.
Obrigado pelos claros esclarecimentos introdutórios quanto as alterações na Lei 11.101/05. Cabe ressaltar, se me permite, a existência dos créditos extraconcursais previstos no art. 84 que, inclusive, serão pagos com precedência aos elencados pelo art. 83! Abraços e obrigado pela contribuição de grande valia.
Os esclarecimentos muito bons. Obrigado , me ajudou muito a começar entender a lei 11101/05.
Meu respeitosos cumprimentos