Insider trading é o uso de informação privilegiada, que ainda não é pública, para ganhar vantagem ao comprar ou vender ações. É uma prática ilegal que fere a igualdade no mercado de capitais, sendo considerada crime.
Você já imaginou ter acesso a um segredo que, se revelado, faria o valor de uma empresa disparar na bolsa? E se você usasse essa informação para lucrar antes de todo mundo? Essa prática tem um nome: insider trading. E é severamente punida.
A confiança e a transparência são pilares essenciais para o funcionamento de qualquer mercado de capitais.
Quando alguém negocia ações ou títulos usando informações que a maioria dos investidores não detêm, chamadas de “informações privilegiadas” ou “não equitativas”, o risco natural da variação de mercado é reduzido de forma desproporcional ao investidor, mas os demais operadores, e sobretudo as companhias investidas passam a ser diretamente prejudicadas.
Assim, o insider trading não prejudica apenas o investidor comum, ele abala a credibilidade de todo o sistema financeiro, afastando a segurança e a justiça que se espera das transações.
Neste artigo, vamos desvendar o que exatamente é essa prática, como ela se manifesta no Brasil e as severas consequências legais para quem a comete.
Além de explorar como as autoridades investigam, as melhores formas de prevenção e como você pode denunciar casos suspeitos.
Continue a leitura! 😉
O que é insider trading?
O insider trading é uma conduta realizada por indivíduos com conhecimento prévio de informações relevantes sobre um valor mobiliário, as quais podem influenciar a decisão de um investidor ao optar por comprar ou vender.
Nesse contexto, toda informação privilegiada é relevante, mas nem toda informação relevante é privilegiada. A informação se torna privilegiada quando é mantida em segredo e confere a alguém uma vantagem injusta no mercado.
Como acontece o insider trading no Brasil?
O insider trading ocorre quando um indivíduo tem acesso a um fato material sigiloso da companhia e decide negociar seus papéis na bolsa.
O insider primário geralmente são diretores, conselheiros, membros de órgãos estatutários e qualquer um que, por força de seu cargo ou função, tenha acesso direto à informação relevante. Pessoas ligadas à empresa que tenham conhecimento do dado, como advogados e consultores, também se encaixam nessa categoria.
Já o insider secundário é aquele que recebe a informação privilegiada de forma indireta. Por exemplo, se um diretor da empresa conta o segredo a um amigo, e este amigo usa o dado para negociar ações, ambos estão cometendo a prática ilegal.
No contexto brasileiro, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) monitora ativamente as negociações atípicas que ocorrem antes da divulgação de fatos relevantes ao mercado.
Um aumento incomum no volume de compra ou venda de ações, seguido de um anúncio importante, é um forte indício de que o insider trading pode ter ocorrido.
As transações são concretizadas por meio da compra ou venda de ações (ou derivativos) na bolsa de valores.
A operação é considerada criminosa no momento em que a negociação é efetuada, antes da publicidade do fato, com o intuito de obter vantagem. O ganho efetivo é apenas a consequência do ato ilícito.
A CVM utiliza ferramentas sofisticadas para rastrear o fluxo de informações e cruzar dados cadastrais com os registros de negociação, montando o quebra-cabeça da violação.
Quais são as penalidades para insider trading?
As consequências para quem pratica insider trading no Brasil são severas e abrangem três esferas de responsabilização: administrativa, cível e criminal. Veja cada uma delas!
Responsabilização administrativa
Na esfera administrativa, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é a autoridade responsável por fiscalizar e punir. De acordo com a Lei n. 6.385/76, a CVM pode impor multas que podem atingir o maior valor entre:
- R$ 50 milhões;
- Três vezes o montante da vantagem econômica obtida ilicitamente; ou
- Três vezes o prejuízo evitado com a operação.
Além da multa, o infrator pode sofrer inabilitação temporária para o exercício de cargo de administrador ou conselheiro em companhias abertas e outras sanções restritivas.
Responsabilização criminal
Na esfera criminal, o insider trading é tipificado no art. 27-D da Lei n. 6.385/76 como crime.
A pena prevista é de reclusão, de 1 a 5 anos, e multa de até três vezes o montante da vantagem ilícita obtida. A condenação criminal, além da privação de liberdade, gera antecedentes criminais e afeta gravemente a reputação do condenado.
Responsabilização cível
Já a responsabilização cível permite que os investidores que foram prejudicados pela conduta desleal busquem na Justiça a reparação dos danos sofridos.
O crime viola o dever de lealdade e transparência, configurando um ato ilícito que gera o dever de indenizar.
É crucial destacar que a ação penal pode ser iniciada pelo Ministério Público, após o envio de um relatório detalhado pela CVM, confirmando a robustez da investigação em todas as frentes.
Quais são as principais diferenças entre as penalidades para insider trading e front running?
Embora ambas as práticas sejam ilícitas e visem desequilibrar o mercado, as penalidades aplicadas ao insider trading e ao front running podem variar significativamente em sua fundamentação legal, sobretudo no âmbito criminal.
O Insider Trading possui uma tipificação penal específica no Código Penal (Lei n. 6.385/76, art. 27-D), como já mencionado. Isso significa que a conduta de utilizar informação relevante não pública é, por si só, um crime autônomo. A pena de reclusão varia de 1 a 5 anos, além da multa. As penalidades administrativas da CVM, por sua vez, são as mais conhecidas e podem atingir três vezes o valor da vantagem obtida.
O Front Running, por outro lado, geralmente é enquadrado no mercado de capitais como manipulação de mercado ou prática não equitativa, infrações previstas na mesma Lei n. 6.385/76, mas sob o Art. 27-C (manipulação de mercado) ou Art. 27-E (exercício irregular de cargo, profissão, atividade ou função).
| Critério | Insider Trading | Front Running |
|---|---|---|
| Fato Típico Central | Uso de informação privilegiada (fato da empresa) para negociar. | Uso de informação sobre ordens de clientes (intenção de negociação) para negociar antes deles. |
| Enquadramento Criminal Principal | Crime Específico (Art 27-D da Lei n 6.385/76). | Enquadramento por Manipulação de Mercado (Art. 27-C) ou Uso Indevido de Informação (Art. 27-D), dependendo do caso. |
| Penalidades CVM | Multas administrativas de até três vezes a vantagem ou o prejuízo evitado. | Multas administrativas e sanções (advertência, inabilitação) por prática não equitativa ou manipulação de mercado. |
| Agente Típico | Administradores e pessoas com acesso à informação interna. | Intermediários (corretores, gestores, analistas) que manipulam ordens de clientes. |
É importante destacar que, embora o front running possa não ter um artigo específico com esse nome no código penal, a CVM atua com rigor na esfera administrativa.
A Autarquia considera que a prática viola o dever fiduciário do intermediário e compromete a integridade do mercado, aplicando multas e sanções que buscam o mesmo efeito inibitório.
Existem exemplos recentes de casos de insider trading no Brasil?
Sim, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Judiciário brasileiro têm atuado de forma contínua e rigorosa no combate ao insider trading, gerando casos emblemáticos que servem de advertência. A CVM divulga periodicamente o resultado de seus Processos Administrativos Sancionadores (PAS) envolvendo a prática.
Um dos casos mais notórios e recentes envolveu a investigação sobre o uso de informação privilegiada no âmbito de uma grande varejista brasileira (Caso Americanas), onde oito ex-diretores foram acusados de negociar ações com conhecimento de inconsistências contábeis relevantes antes que o fato fosse revelado ao público. Esse inquérito demonstrou a capacidade da CVM de reunir elementos robustos e convergentes para sustentar a acusação de uso indevido de informação.
É importante notar que, embora os casos midiáticos recebam maior atenção, a CVM está sempre monitorando o mercado e punindo infrações de menor escala, reforçando o dever de lealdade e a igualdade de condições para todos os investidores.
A constante atuação da autarquia mostra o amadurecimento e o rigor do nosso mercado de capitais!
Como posso denunciar um caso de insider trading?
A participação da comunidade de investidores e de insiders que buscam a conformidade é fundamental para a integridade do mercado. Se você tiver conhecimento ou suspeitar de um caso de insider trading, existem canais oficiais e seguros para realizar a denúncia.
O principal canal para isso é a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A denúncia pode ser feita através do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC) da CVM, disponível no portal oficial do Governo Federal.
Ao registrar a denúncia, é crucial fornecer o máximo de detalhes possível, como:
- Identificação (se souber) ou elementos que ajudem a identificar os envolvidos;
- Quais foram as operações suspeitas e o período em que ocorreram;
- A informação privilegiada que teria sido utilizada;
- Documentos ou elementos comprobatórios que fundamentam a alegação.
Além do SAC, existe a opção de Delação Anônima por meio de um e-mail específico da CVM. Para que a denúncia anônima seja eficaz, a CVM enfatiza a necessidade de identificar os delatados e as operações, além de fundamentar as alegações com documentos.
É vital lembrar que a CVM atua na apuração de ilícitos do mercado de capitais. Investidores prejudicados também podem, dependendo do caso, ajuizar uma ação cível buscando a reparação dos danos com fundamento na Lei das S.A. (art. 155, §3º) ou no Código Civil.
Quais leis regulamentam o insider trading no Brasil?
O combate ao uso indevido de informação privilegiada é um pilar da integridade do mercado de capitais brasileiro, e sua regulamentação é robusta, sustentada por três grandes instrumentos legais e regulamentares.
1. A Lei do Mercado de Valores Mobiliários (Lei nº 6.385/76)
O principal marco é o Artigo 27-D da Lei nº 6.385/76. Este artigo transforma o insider trading em um crime propriamente dito, com pena de reclusão.
A tipificação se concentra na conduta de utilizar uma informação relevante (não divulgada, obtida sob dever de sigilo) para obter vantagem na negociação de valores mobiliários.
É o dispositivo que permite ao Ministério Público Federal e ao Judiciário atuarem na esfera criminal, aplicando as penas de prisão e as multas mais pesadas.
A redação visa punir tanto o agente que gerou a informação (insider primário) quanto aquele que a recebeu de forma ilícita (insider secundário).
2. A Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/76)
A Lei das S.A. estabelece o fundamento ético e cível da proibição, focando no dever de lealdade dos administradores. O Artigo 155, § 1º proíbe o administrador de se valer da informação relevante para obter vantagem, caracterizando a conduta como violação de dever fiduciário.
Por sua vez, o art. 155, §4º, estende a vedação do uso da informação sigilosa a qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, ainda que seja obter vantagem para terceiros.
Essa legislação é crucial porque cria a base para a responsabilização administrativa e cível. Ela estabelece que os administradores (conselheiros e diretores) não apenas devem guardar sigilo, mas também têm o dever de não negociar com base nesse conhecimento, protegendo a companhia e o mercado.
3. Resolução CVM nº 44/2021
O detalhamento prático e as regras de compliance são encontrados na Resolução CVM nº 44/2021 (que revogou a antiga Instrução CVM nº 358). Esta norma regula minuciosamente o dever de informar e a negociação.
Ela é essencial na medida em que define o Fato Relevante com uma lista exemplificativa de eventos que, se ocorridos ou decididos, são considerados relevantes, como fusões, cisões, mudanças no controle acionário, e planos de desinvestimento.
Ainda, a normativa institui o “Período de Vedação”: Proíbe a negociação por insiders (administradores, conselheiros, fiscais e a própria companhia) nos 15 dias que antecedem a divulgação das informações trimestrais (ITR) e anuais (DFP).
Também regulamenta o Plano de Negociação: Permite que insiders negociem suas ações mesmo durante os períodos de vedação ou posse de informação, contanto que as operações sigam um plano de negociação previamente definido (e divulgado) que retire o elemento de discricionariedade do agente.
Portanto, a regulamentação brasileira funciona em camadas: a lei criminaliza, a lei societária estabelece o dever fiduciário e de reparação, e a Resolução CVM dita as regras operacionais de transparência e os limites para a negociação.

Como a CVM atua na fiscalização e punição do insider trading?
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é o xerife do mercado de capitais brasileiro e desempenha um papel triplo na luta contra o insider trading: fiscalização, investigação e punição administrativa. Sua atuação é fundamental para proteger a confiança dos investidores e a credibilidade do mercado.
A CVM monitora continuamente as negociações em bolsa, utilizando sofisticados sistemas de supervisão.
Esses sistemas são programados para identificar “picos” atípicos de negociação de ações de uma companhia imediatamente antes de um fato relevante (como um anúncio de aquisição ou de resultados financeiros) se tornar público. A análise de volume e preço de negociação é o primeiro sinal de alerta.
Uma vez detectada a atipicidade, a CVM instaura um Inquérito Administrativo. Nesta fase, a Autarquia exerce seu poder de polícia para requisitar informações e documentos detalhados, como notas de corretagem, registros de acesso a sistemas internos das companhias e comunicados internos.
O foco é mapear o fluxo da informação relevante e traçar o nexo causal entre o acesso à informação e a negociação efetuada.
Se as provas forem robustas, a CVM instaura um Processo Administrativo Sancionador (PAS). Em seus julgamentos, o Colegiado da CVM aplica as sanções previstas na Lei nº 6.385/76, que podem ser:
- Advertência: sanção mais branda.
- Multa Pecuniária: como detalhado anteriormente, as multas são altíssimas, buscando anular e punir o ganho indevido.
- Inabilitação: proibição de atuar, por tempo determinado, como administrador, conselheiro, ou exercer certas funções no mercado.
A atuação da CVM é ainda reforçada pela sua colaboração com o Ministério Público Federal (MPF). Ao identificar o crime de insider trading Art. 27-D), a CVM envia o inquérito ao MPF, possibilitando a abertura da ação penal e, assim, a punição nas esferas administrativa e criminal simultaneamente.
Existem recursos disponíveis para empresas que querem implementar medidas para prevenir o insider trading?
Sim, há uma série de recursos, orientações e estruturas de compliance que as companhias abertas e os participantes do mercado podem e devem adotar para mitigar o risco de insider trading.
O principal recurso é o conjunto de normas e orientações emitidas pela própria CVM, especialmente a Resolução CVM n. 44/2021. Esta resolução serve como um guia ao determinar a obrigatoriedade de certas políticas.
Alguns recursos e ferramentas de prevenção são:
Políticas de divulgação de fato relevante
As empresas devem ter um procedimento claro e rápido para a divulgação de informações sensíveis, garantindo que o mercado seja informado de maneira simultânea e completa.
Política de negociação de valores mobiliários
É o documento interno que define as regras e restrições para a negociação de ações por parte dos insiders (administradores, conselheiros, etc.). Ele deve estabelecer os “períodos de silêncio” e as vedações específicas.
Planos Individuais de Investimento (PIIs) ou planos de negociação
Conforme a CVM, esses planos permitem que insiders estabeleçam operações futuras de compra e venda com antecedência (mínimo de seis meses), tirando a discricionariedade do agente. Isso comprova que a negociação não foi motivada por informação privilegiada.
Insider List (Lista de Pessoas com Acesso à Informação)
Manter uma lista detalhada e atualizada de todos os colaboradores, consultores, advogados e terceiros que, em caráter temporário ou permanente, tiveram acesso a uma informação relevante específica. Essa lista facilita a investigação em caso de vazamento.
Treinamento e canais de denúncia
Ações contínuas de treinamento sobre ética no mercado e as regras da CVM são essenciais. Além disso, a implementação de um Canal de Denúncia confidencial e independente é vital para que os próprios colaboradores reportem suspeitas de vazamento.
Conclusão
O insider trading não é apenas uma infração administrativa; é um crime de grave impacto que atenta contra a própria essência de um mercado de capitais justo e transparente.
Como vimos, sua prática é um abuso da confiança e do dever de lealdade, corroendo a igualdade de condições que deve prevalecer entre todos os investidores.
O arcabouço legal brasileiro é claro ao tipificar, coibir e punir severamente essa conduta, seja com pesadas multas administrativas, seja com penas de reclusão, como demonstrado pelos casos emblemáticos envolvendo grandes corporações.
O entendimento sobre a ilegalidade do uso da informação privilegiada é vital não apenas para administradores e executivos, mas para qualquer pessoa que participe do mercado. A integridade é construída por meio da vigilância e do rigor.
Ao priorizar a ética e a legalidade nas negociações, empresas e investidores contribuem para um ambiente financeiro mais seguro, confiável e propício ao desenvolvimento econômico. A transparência no mercado de capitais é um bem coletivo que todos temos o dever de proteger.
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Advogado (OAB 97692/PR). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná - UFPR e Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pela PUC/PR. Sou membro do Núcleo de Pesquisas em Políticas Públicas e Desenvolvimento Humano (NUPED) e sócio fundador da Martinelli...
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